PL apresentado no último dia 10 de dezembro já tem parecer favorável da CCJ, mas tramitação deve ser suspensa a pedido de prefeitos
Presidente reeleito da Associação Amazonense de Municípios diz que estudo interno mostra prejuízo às prefeituras com modelo proposto de ICMS Ecológico. Debate sobre critério será feito em 2025 (Diego Peres e Janailton Falcão/Divulgação)
O governo Wilson Lima (União) propôs reduzir a divisão igualitária do ICMS para destinar 5% a prefeituras que atuam na preservação ambiental e no combate às mudanças climáticas. O Projeto de Lei 877/224, enviado à Assembleia Legislativa em 10 de dezembro, já recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça, mas deve ter a tramitação suspensa a pedido da Associação Amazonense de Municípios (AAM). Para a entidade, na prática, R$ 729 milhões seriam comprometidos pelo novo critério.
A gestão estadual é responsável pela arrecadação do ICMS, mas 25% de todo o recolhimento é distribuído para as prefeituras. Deste percentual, 75% é dividido conforme a riqueza gerada em cada município e outros 25% com base em critérios definidos pelos estados, que podem incluir desde o número populacional até políticas ambientais, como o novo ICMS Ecológico.
Atualmente, dos 25% do ICMS destinados aos municípios, 14% são divididos igualmente entre as prefeituras. Com a aprovação do novo PL, esse percentual de ‘igualdade’ cairia para 9%, e os 5% restantes seriam redistribuídos pelo critério do ICMS Ecológico. Assim, parte dos recursos antes compartilhados igualmente seria destinada às ‘prefeituras verdes’.
Segundo a Associação Amazonense de Municípios (AAM), o percentual proposto de 5% para as prefeituras verdes, na prática, comprometeria 20% do total atualmente destinado a cada município. Considerando o acumulado de ICMS até 12 de dezembro deste ano (R$ 3,6 bilhões), o novo critério destinaria cerca de R$ 729 milhões para as gestões pró-meio ambiente.
A Associação também demonstrou preocupação com a redução de ICMS para os municípios amazonenses que historicamente concentram as queimadas e desmatamento ilegais, como as prefeituras do sul do estado.
Na mensagem encaminhada à Assembleia Legislativa, o governo explicou que a proposta integra o Programa de Ajuste e Sustentabilidade Fiscal e Ambiental do Amazonas, apoiado pelo Banco Mundial. Os critérios que definirão se uma prefeitura é ‘verde’ só serão definidos após a aprovação da Lei, via decreto governamental.
Ainda não é possível visualizar com exatidão quais prefeituras ganham ou perdem com o novo modelo de divisão do ICMS, já que os critérios ainda serão definidos. No entanto, é possível ter alguma ideia ao considerar que a existência de unidades de conservação no município deve ser uma das características para classificar a prefeitura como “verde”.
Atualmente, o Amazonas possui 42 unidades de conservação (UC) geridas pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Essas áreas abarcam um território que alcança 33 dos 62 municípios do Amazonas, conforme levantamento de A CRÍTICA.
Considerando apenas esse aspecto, as prefeituras mais beneficiadas seriam a de Apuí, alcançada por seis unidades de conservação, Novo Aripuanã (5), Borba (5), Manaus (4), Manicoré (4) ,Coari (3), Canutama (3), Tapauá (3) e Novo Airão (3). Os outros 24 municípios da lista possuem uma ou duas unidades de conservação em seu território.
Chama a atenção que seis das nove prefeituras beneficiadas, se considerado apenas esse critério, seriam as mesmas recordistas de focos de calor em 2024. Apuí, por exemplo, que tem mais unidades de conservação, registrou 4.663 focos neste ano, o maior número para um município amazonense. Outros foram Novo Aripuanã (2.583F), Manicoré (1.879F), Canutama (1.081F), Tapauá (533F) e Borba (404F).
Procurado pela reportagem, o prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), elogiou a proposta do ICMS Ecológico.
“Novas fontes de renda são bem-vindas, então acredito que o governo tenta dessa forma conseguir mais recursos através da questão ecológica que ,sem dúvida alguma, possam somar ao que a gente já tem e melhorar as nossas condições de investimento na nossa cidade”, disse.
Um estudo publicado na revista ‘Planejamento e Políticas Públicas’, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), concluiu que o ICMS Ecológico pode ser “um importante instrumento de política pública ambiental, quando bem estruturado e com indicadores adequados”. Uma das críticas ao modelo é justamente quando a definição dos critérios é mais quantitativa do que qualitativa. “ O uso de indicadores exclusivamente quantitativos pode conduzir a expansão de áreas que não cumpram efetivamente um papel na conservação ambiental”, afirmam os pesquisadores.
O ICMS Ecológico já está presente em 18 estados brasileiros (sem considerar o Amazonas). O Paraná foi o pioneiro do modelo ao instituí-lo em 1990. O estado que faz a maior divisão para esse critério é o Acre, com 20% destinado a municípios com unidades de conservação.
Especialista em direito tributário, o advogado Victor Bastos da Costa destaca que esse tipo de solução não é novidade, mas o avançar da agenda ambiental coloca pressão sobre o poder público para encontrar medidas de combate à mudança do clima.