Projeto limita procedimento até 22 semanas e equipara aborto a homicídio simples
(Foto: Divulgação)
Deputados amazonenses de direita comemoraram a aprovação do pedido de urgência do projeto de lei (PL) 1904/2024, que equipara o aborto ao crime de homicídio simples, previsto no artigo 121 do Código Penal, “quando houver viabilidade fetal, presumida em gestações acima de 22 semanas”.
O projeto também pune o médico e a gestante que realizarem aborto acima de 22 semanas de gestação, mesmo em casos de estupro e risco de vida da mãe, e é extremamente criticado por dar margem para que crianças vítimas de estupro sejam obrigadas a ter filhos gerados pela violência.
Em suas redes sociais, o deputado federal Capitão Alberto Neto (PL) declarou apoio público ao projeto, exclamando “sim para vida”. A deputada estadual Débora Menezes (PL) também se manifestou favoravelmente. No texto de parabenização, a parlamentar ressalta que o projeto acaba com a previsão legal de aborto decorrente de estupro a partir dos 5 meses.
(Foto: Reprodução/ X)
A urgência do projeto foi posta em pauta pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e foi aprovada em 23 segundos. Deputados reclamaram da forma como o presidente conduziu a sessão e afirmaram que não sabiam o que estava sendo votado.
O projeto é de autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), membro da Bancada Evangélica e ligado à Igreja Evangélica Assembleia de Deus, além de ser franco aliado do pastor Silas Malafaia. O parlamentar declarou que a proposta tem o propósito de testar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que enviou uma carta aos evangélicos na campanha de 2022 onde afirmou ser contrário ao aborto.
Atualmente, as penas para o aborto não previsto em lei vão de um a três anos quando a própria gestante o provoca ou permite que outra pessoa provoque. Se alguém provoca o aborto sem consentimento da gestante, a pessoa pode ser condenada a reclusão de três a dez anos, enquanto o aborto com consentimento tem pena de um a quatro anos.
A legislação também prevê a realização do aborto em qualquer época em caso de risco de vida da mãe, estupro e anencefalia do feto.
Caso o PL 1904/2024 avance, a gestante que abortar poderá ser condenada com reclusão de seis a vinte anos. O grande problema levantado pelos críticos da proposta é acabar com a prerrogativa de aborto em casos de estupro, risco de vida e anencefalia do feto em qualquer época, como ocorre atualmente. Se a gravidez for fruto de estupro e a vítima não conseguir realizar o procedimento até 22 semanas, ela poderá ser condenada até 20 anos de prisão. Em comparação, o crime de estupro possui pena de seis a dez anos.
Segundo a última edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o Brasil registrou 74.930 casos de estupro e estupro de vulnerável no ano de 2022. O perfilamento das vítimas revelou que as maiores afetadas pelo crime eram crianças e adolescentes: 61,4% das vítimas tinham no máximo treze anos de idade.
Os dados mostram ainda que 68,3% dos crimes ocorria dentro da própria residência da vítima. O Anuário registra que 86,1% dos estupradores são conhecidos das vítimas de 0 a 13 anos e que 64,4% das agressões sexuais vem dos próprios familiares.
Em 2020, uma menina de dez anos engravidou após ser estuprada pelo tio no município de São Mateus, estado do Espírito Santo. A criança foi levada para o hospital e estava amparada pela legislação para interromper a gestação, mas a unidade hospitalar informou que não teria profissional para realizar o procedimento, pois a gravidez já passava de 22 semanas.
A vítima precisou viajar até Recife, capital de Pernambuco, para interromper a gestação. Na época, grupos evangélicos tentaram forçar a avó da menina a não interromper a gestação, mesmo com risco de vida da vítima. Manifestantes religiosos chegaram a se reunir em frente ao Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, na capital pernambucana, xingando os médicos e a criança de assassinos.