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Deepnudes e crimes virtuais: projeto de lei busca proteção legal para vítimas

Especialistas defendem tipificação no Código Penal e alertam para os riscos da IA na exposição de mulheres

Emile de Souza
08/02/2025 às 09:36.
Atualizado em 08/02/2025 às 09:40

Projeto de Lei quer criar crime específico para produção e divulgação de imagens de nudez criadas com inteligência artificial com intuito de prejudicar alguém (Foto: Mauro Pimentel/AFP)

O advogado especialista em direito digital, Aldo Evangelista, defendeu o Projeto de Lei (PL) 3.821/2024, que inclui o “deepnude” no Código Penal. A proposta, de autoria da deputada Amanda Gentil (PP-MA), está em análise na Câmara dos Deputados e busca criminalizar a criação e divulgação de imagens de pessoas nuas geradas por inteligência artificial, prevendo penalidades mais severas quando a vítima for mulher.

“O projeto de lei é importante justamente para manter esse diálogo, porque, infelizmente, a maioria das vítimas na internet são mulheres, crianças e idosos. Já existe crime para essa finalidade hoje, mas, se o projeto pretende criar um tipo penal específico para a questão do fake nude, com uma possível pena maior e direcionado especificamente às mulheres, é louvável que esse assunto seja amplamente debatido no Congresso Nacional”, afirmou Evangelista.

O advogado destacou a importância de discutir e aprovar essa e outras leis que regulamentem o uso da tecnologia, garantindo mecanismos de educação digital e identificação de conteúdos, que se tornam cada vez mais realistas.

“Conforme a tecnologia avança, futuramente ficará cada vez mais difícil identificar essas manipulações devido à qualidade aprimorada das gerações. Talvez seja necessário um aplicativo ou algo semelhante para verificar o que é verdadeiro ou não, uma espécie de contraprova”, explicou.

Atualmente, fazer vídeos falsos expondo pessoas já é considerado crime no Brasil, tipificado como difamação. No entanto, o PL 3.821/2024 inclui especificamente no Código Penal o crime de manipular, produzir ou divulgar, por qualquer meio, conteúdo de nudez ou ato sexual falso, gerado por tecnologia de inteligência artificial ou por outros meios tecnológicos, com a finalidade de humilhar, intimidar ou constranger.

O texto prevê pena de reclusão de dois a seis anos e multa, caso o fato não constitua crime mais grave. Além da tipificação e do aumento de pena, Evangelista ressaltou que é necessário investir em educação digital, pois a punição, por si só, não é suficiente para resolver o problema.

“No geral, apenas criar um tipo penal não resolve. É necessário implementar a educação digital desde a infância até a terceira idade. No caso específico das meninas e mulheres, é essencial que tenham cuidado com as imagens que compartilham nas redes sociais e na internet, além de cautela em relações íntimas, para evitar que sejam usadas por pessoas mal intencionadas”, alertou.

Evangelista lembrou que esses crimes podem ser enquadrados como crimes contra a honra e difamação, mas que as discussões sobre delitos virtuais ainda enfrentam dificuldades devido à falta de regulamentação específica.

“A regulamentação das redes sociais digitais é outro projeto de lei parado na Câmara dos Deputados. Não sei se terá andamento, mas ele busca discutir temas como liberdade de expressão e os limites do uso das redes sociais no Brasil. No país, em geral, não há uma legislação específica para regular a inteligência artificial”, criticou o especialista.

O PL, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que trata da regulamentação da inteligência artificial, foi aprovado no Senado Federal em 10 de dezembro de 2024 e agora segue em tramitação na Câmara. No entanto, Evangelista teme que, assim como outras propostas de regulamentação das redes sociais, o projeto fique estagnado.

Segundo o advogado, a ausência dessa regulamentação e, principalmente, a falta de medidas voltadas à educação digital, representam um perigo, pois a IA generativa avança rapidamente e se torna cada vez mais difícil de detectar.

Mulheres são as principais prejudicadas

A doutora em processos socioculturais da Amazônia, Ivânia Vieira, afirmou que as mulheres são as principais vítimas de deepnudes, utilizados como forma de humilhação social.

“Mais de 100 mil mulheres foram vítimas de deepnudes em 2022, sendo que 70% eram mulheres comuns, não celebridades. O cenário é grave e, no ambiente escolar, ganha uma dimensão ainda mais perigosa, levando algumas meninas ao suicídio ou ao isolamento total devido à exposição gerada por essas imagens ou pela ameaça de sua divulgação”, destacou a professora.

Vieira explicou que a exploração da imagem feminina está ligada à lucratividade e ao desrespeito ao corpo da mulher.

“Há uma conexão direta com o desejo de explorar e expor o corpo feminino à exaustão. A indústria já seguia esse caminho antes da inteligência artificial, e agora a IA acelera e potencializa essa exploração, tendo como alvos principais mulheres, jovens e crianças. Isso gera conteúdo, lucro e reforça a violação dos direitos das mulheres, ampliando os mecanismos de opressão”, pontuou.

Pena é maior se vítima for mulher

Conforme a proposta, a pena será aumentada de 1/3 até a metade se a vítima for mulher. Caso o crime seja cometido mediante disseminação em massa, por meio de redes sociais ou plataformas digitais, a pena poderá ser aumentada de 1/3 até o dobro.  O PL também prevê ação penal pública incondicionada para esse crime, ou seja, a investigação poderá ser iniciada sem a necessidade de representação formal da vítima.

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