fala polêmica

Cota para negros é discriminatória, diz procurador da CMM

Silvio da Costa afirmou que não há racismo na inexistência de cota racial no concurso público da casa legislativa

Emile de Souza
politica@acritica.com
21/11/2024 às 17:11.
Atualizado em 21/11/2024 às 17:11

Silvio da Costa, procurador da Câmara Municipal de Manaus (Foto: Reprodução)

O procurador responsável pelos processos do concurso público da Câmara Municipal de Manaus (CMM), Silvio da Costa, afirmou que a cota para negros é discriminatória. Disse  que não existem leis municipais que obriguem a previsão  de vagas destinadas a grupos minoritários em concursos públicos. E rebateu a denúncia de racismo apresentada contra a CMM em nota de repúdio assinada pela Ordem dos Advogados do Brasil seccional do Amazonas, União de Negros e Negras pela Igualdade(Unegro), Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEI-AM), Coletivo Pererê e a Associação pela Advocacia Popular do Amazonas,

“Cota para negro é discriminatório. Eu sou a favor de uma cota seguinte, tanto na universidade quanto para os concursos públicos, cota para todos aqueles que estudaram em escola pública. Aí eu sou a favor. Se é branco, se é preto, se é pardo, se é índio, se é quilombola, não interessa. Estudou em escola pública, tem que ter cota”, afirmou o procurador.

Na quarta-feira,  Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, as entidades repudiaram o fato da CMM ter ignorado no edital do concurso público realizado no fim de semana a cota racial. “A cota racial não é favor, é uma justiça histórica, e tratá-la com uma linguagem ofensiva, de desprezo, de apagamento, é potencializar o código de linguagem que dá suporte ao racismo”, diz um trecho do posicionamento das organizações. 
De acordo com as entidades, os termos usados pela procuradoria da CMM, no processo judicial que pede a suspensão do concurso, como: “nossa população é majoritariamente parda, quase não há negros”, são discriminatórios.

Ao A CRÍTICA, Silvio da Costa disse que essa expressão não tem conotação racista, reflete dados do censo do IBGE, que define a população manauara como maioria parda. 
“Eles (movimento negro) têm direito de achar o que eles quiserem em relação a isso, né? E adotar as medidas que eles acharem necessárias. Mas agora, eu dizer que a maioria da população do Amazonas, de Manaus é parda, eu não vejo isso como nenhum tipo de agressão nem racismo. Porque de fato é. É só eles verificarem os índices do IBGE”.

O procurador informou que não há uma lei municipal que define a necessidade de cotas e que somente a lei federal existente não é suficiente. 

“A alegação do Ministério Público é que eles queriam as cotas para negros, para indígenas e quilombolas, correto? Só que o que acontece, eles firmaram a alegação deles e a ação deles em cima de uma lei federal. Essa lei federal, ao contrário de uma lei nacional, a lei federal é específica para os concursos na área federal. Ela não abrange a área nem estadual nem municipal”, disse.

Silvio da Costa afirmou que para ter validade no município, as pessoas devem cobrar os entes legislativos (os vereadores) para elaborarem leis válidas aos certames locais. “Ao invés de eles me atacarem como procurador ou atacarem a procuradoria porque se posicionou dessa forma, eles deveriam fazer um movimento junto à Câmara Municipal de Manaus, junto aos vereadores, para que produzam a legislação”

Outro trecho da manifestação da CMM, no processo, considerado de cunho racista pelas entidades, na nota de repúdio, diz o seguinte: “Na cidade de Salvador, por exemplo, criar cotas para negros, seria fazer discriminação a pessoas brancas, pardas, indígenas naquela região (…) Por isso, desejar estabelecer cota para o certame em virtude de cor da pele preta, na verdade, se constitui ato discriminatório que incentiva a desigualdade racial, contra a população de pele branca, parda, amarela, etc. (…) Ilusórias suposições de promover igualdade racial, quando na verdade, milita em favor de promover uma desigualdade racial (…) Famigerados esquerdopatas (…)”.

As organizações que subscrevem o documento também ressaltaram a gravidade do ato apontado como discriminatório partir de um agente público. “Quando a linguagem racista fala através de um agente público isso compromete a própria burocracia, torna a violência racista institucional, sendo necessário que se reaja de imediato”.

‘Tenho negros na família’

O procurador reafirmou à reportagem que sua conduta não foi racista, mas baseada em dados de raça e se colocou à disposição para discussões com os grupos minoritários. 
“Se eles quiserem se reunir comigo na Câmara, também não tenho problema nenhum com isso. Eu tenho pessoas negras na minha família, eu não tenho nenhum tipo de discriminação. Agora, o que eu falei é verdade.  Eles têm que consultar o IBGE, o IBGE vai dizer que a maior quantidade de pessoas aqui são pardas e índios. Aí se você for na Bahia, qual é a maior quantidade? São pretos. Isso daí é uma constatação, qual é a ofensa nisso de eu dizer isso?”

Questionado sobre a realidade desigual entre pessoas brancas, pretas e indígenas que são expostas nas pesquisas do IBGE, o procurador informou que os problemas devem ser tratados na raiz. 

“Eu acho que essas desigualdades acontecem e o Estado tem que agir para que elas deixem de acontecer. Essa questão de cotas, para mim, é a mesma história do seguinte, você está com um problema na unha encravada, com uma unha encravada, você corta a perna. Você tem que tratar a unha encravada e resolver o problema da unha encravada. Eu não posso fazer isso”, disse.

‘Vitimização’

Silvio da Costa criticou os movimentos negros por buscarem a garantia da cota. Segundo ele, as cotas são uma forma de manter uma “vitimização” e não resolver os problemas na raiz. 

“Os negros, eles têm que lutar para que isso não exista mais. Não lutar por uma vitimização, porque eu quero cota, porque eu sou vítima. Eles têm que lutar, e nós todos temos que lutar, para que eles não sejam mais vítimas. Essa questão de você fazer cota, é simplesmente perpetuar a vitimização deles. Então hoje esses movimentos que não percebem isso ficam vivendo de migalhas”.

O concurso da CMM foi realizado no último domingo (17/11). O processo judicial movido pelo Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) pedindo a suspensão do certame pela ausência de cota racial nos editais tem como juiz Ronnie Frank Stone. Decisão do magistrado rejeitando o pedido do MP-AM foi confirmada pela desembargadora Oniza Abreu Gerth às vésperas da realização das provas.

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