Assunto vai ao plenário

Comissão da Câmara aprova relatório de projeto que proíbe aborto até em caso de estupro

Projeto que altera Constituição ainda deve ser analisado por uma comissão especial

Lucas dos Santos
politica@acritica.com
27/11/2024 às 15:08.
Atualizado em 27/11/2024 às 17:11

(Divulgação/Câmara dos Deputados)

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados aprovou o relatório que admite a tramitação do projeto de emenda à Constituição (PEC) 164/2012 que, na prática, proíbe o aborto até mesmo nos casos previstos em lei, como estupro, risco de vida da gestante e de feto anencéfalo.

A proposta modifica o artigo 5º da Constituição Federal para proteger o direito à vida “desde a concepção" e é de autoria do ex-deputado cassado Eduardo Cunha (Republicanos-RJ) e do ex-deputado João Campos de Araújo (Republicanos-GO), dois dos maiores expoentes da bancada evangélica.

Inicialmente, o projeto foi aprovado por 35 votos “sim” contra 15 votos “não”. Posteriormente, os deputados Capitão Alberto Neto (PL-AM) e Bia Kicis (PL-DF) pediram para que fossem registrados seus votos favoráveis ao projeto. Como está em tramitação normal, a PEC deve ser analisada por uma comissão especial que discutirá o mérito do projeto. Caso seja aprovada, irá ao plenário da Câmara, onde necessitará de 308 votos para ser aprovada.

Em defesa do projeto, a deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do ex-deputado Eduardo Cunha, acusou a base do governo Lula (PT), contrária à proposta, de querer contaminar a discussão antecipando o mérito e que a PEC o pressuposto pela Convenção Interamericana de Direitos Humanos.

“Essa convenção claramente é contra o aborto, contra a ideia de que o feto é parte do corpo da mulher. O aborto é nada mais, nada menos, que o assassinato de um bebê indefeso. Quem defende o aborto é cúmplice desse assassinato”, disse Dani.

Crítica da proposta, a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) afirmou que a PEC era pior que o projeto de lei apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), o qual buscava limitar o aborto após 22 semanas de gestação mesmo nos casos de estupro.

“Não se trata apenas a partir de 22 semanas, mas em qualquer tempo gestacional. Então, nesse aspecto, já é pior, mas há outros aspectos, porque ela impede o direito ao aborto, inclusive quando significa risco de morte para a gestante. [...] esta PEC também é um retrocesso para aqueles casos de gestação com fetos anencéfalos e que, portanto, não têm possibilidade de vida extrauterina, porque isso, para algumas mulheres, pode significar uma dor e uma tortura”, disse a deputada.

A deputada Coronel Fernanda (PL-MT) criticou a prática do aborto e dramatizou a fala pedindo aos colegas que imaginassem “como é que está sendo morta essa criança sendo arrancada pedaço por pedaço”.

“Primeiro arrancam o bracinho, depois arrancam a perninha, depois eles puxam a cabeça, picotam a criança. No final, sugam o que sobrou. É bonito pegarmos a criança sorrindo, grandinha, no nosso braço e balançá-la para lá e para cá. Mas é difícil você se colocar como responsável por isso”, disse.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) criticou colegas que usaram de argumentos religiosos para apoiar o projeto, chamado por eles de PEC da Vida, dizendo que “não se pode confundir os espaços que estamos ocupando”.

“O Estado brasileiro é um estado laico. Não nos cabe aqui fazer com que a Constituição se transforme em uma reprodução de concepções religiosas. Aqui se assegura a liberdade de credo, e é fundamental que seja mantida. Não podemos permitir aqui que, em plena discussão nessa comissão, fique fazendo uma oração que nós oramos nos espaços que cabem, mas tentar pisotear a própria Constituição e os direitos e se fazer uma defesa a partir de concepções religiosas é romper a própria laicidade do estado”, afirmou.

Tensão

Momentos antes da discussão, a presidente da comissão, deputada Carol de Toni (PL-SC), mandou a polícia legislativa retirar representantes do movimento feminista que protestavam contra a PEC com os dizeres "criança não é mãe, estuprador não é pai".

Escárnio

Crítica da proposta desde a apresentação do PL de Sóstenes Cavalcante, a deputada estadual Alessandra Campêlo (Podemos) afirmou para A CRÍTICA que a PEC "é uma afronta aos direitos das mulheres e a própria Constituição Federal" pelo potencial de proibir o aborto nos casos previstos em lei 

"É um escárnio diante do levantamento do Anuário de Segurança Pública, que mostra que, no total, 83.988 mulheres e meninas foram vítimas de estupro e estupro de vulnerável no ano passado", afirmou.

A parlamentar chamou a proposta de cortina de fumaça para desviar do "verdadeiro assunto que toma conta do Brasil, e todos sabem do que eu estou falando".

Sobre o texto da PEC, Alessandra relembra que a Constituição e o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiram que o aborto não é considerado crime nos casos de estupro, anencefalia do feto e risco de vida da mãe.

"Esse tema é uma questão de direito adquirido e, especialmente no que diz respeito à interrupção de gravidez em casos de crimes sexuais, a minha opinião é clara e continua a mesma: estuprador não é pai, nunca será e qualquer proposta nesse sentido terá o meu repúdio", conclui.
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