Aluguel de veículos zero quilômetro e com câmbio automático custará mais de meio milhão por mês
(Fotos: Danillo Mello/ALE-AM e divulgação/Ford)
A Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) vai pagar mais de meio milhão (R$ 529 mil) mensalmente pelo aluguel de 37 picapes de câmbio automático para uso dos deputados estaduais e servidores administrativos da Casa.
Cada veículo custará R$ 14,3 mil por mês, segundo despacho de homologação assinado pelo presidente da ALE-AM, Roberto Cidade (União) e pelo diretor-geral da casa, Wander Motta, no último dia 28 de janeiro.
Em doze meses, os gastos da ALE-AM com locação das picapes de luxo chegarão a R$ 6,3 milhões. A contratação ocorrerá via adesão à Ata de Registro de Preços (ARP) nº 8/2024, do Distrito Sanitário Especial Indígena Amapá e norte do Pará (DSEI-AMP). A legislação permite que um órgão público seja incluído em um processo licitatório já em andamento.
Conforme o documento, a empresa que fornecerá o aluguel dos veículos é a Kaele LTDA (KL Rent a Car), especializada neste tipo de serviço. A companhia já forneceu automóveis para a ALE-AM em outros anos e também atende prefeituras do Amazonas. O sócio-administrador é o empresário José Neilo de Lima Silva.
De acordo com a descrição do serviço, os 37 veículos são do ano de 2024, zero quilômetro, com cinco portas e um porta-mala, direção eletrônica, câmbio automático de seis marchas, vidros e travas elétricas, aparelho de som AM/FM, airbags para motorista e passageiro.
No despacho assinado pelo presidente da ALE-AM, a contratação é descrita como “solução para a necessidade de serviços de transporte destinada ao suporte logístico às atividades parlamentares e administrativas” da Casa.
Os deputados do Amazonas já têm à disposição R$ 49,8 mil mensais da chamada Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP) que permite a locação de veículos para o suporte logístico das atividades do mandato.
Somente em dezembro de 2024, metade dos 24 parlamentares utilizou o recurso para locação de veículos, totalizando um gasto de R$ 137 mil. O maior valor, R$ 21 mil, foi utilizado pelo deputado estadual Cabo Maciel (PL), seguido por Carlinhos Bessa (PV), com R$ 15 mil, e João Luiz (Republicanos), com R$ 14 mil.
O presidente da ALE-AM, deputado Roberto Cidade, responsável por assinar o despacho das 37 picapes automáticas, também utilizou o ‘Cotão’ para a contratação de veículos. Em dezembro, ele destinou R$ 12 mil para essa finalidade.
Além de locação de veículos, a CEAP também é utilizada para aquisição de combustíveis e fretamento de aeronaves. Outros gastos incluem assessoramento jurídico, contábil, de comunicação e compra de materiais gráficos para divulgação da atividade parlamentar.
A reportagem procurou a Assembleia Legislativa e o presidente da Casa via assessoria de comunicação na quarta (5) e quinta-feira (6), mas não houve retorno. O espaço continua aberto para manifestações.
O Coordenador do Comitê Amazonas de Combate à Corrupção (CACC), Carlos Santiago, criticou a contratação. A rede reúne entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil, o Sindicato dos Jornalistas do Amazonas e o Conselho Regional de Contabilidade, dentre outros.
“A compra ou manutenção de picapes luxuosas para os parlamentares também não contribui em nada para melhorar a imagem do legislativo estadual, tampouco eleva a qualidade da política”, afirma.
“É essencial que, neste momento, o legislativo estadual busque maior sintonia com a sociedade, intensifique a fiscalização, amplie seus dias de trabalho e abra mão de benefícios, como o uso de veículos em contratos onerosos”, acrescenta.
O cientista político afirmou que o Legislativo estadual tem avançado com propostas com má repercussão popular, como a que pretende reduzir os dias de sessão de três para dois por semana (sendo um deles com horário dobrado). Os deputados defendem que a medida irá aumentar os dias em que poderão estar nas suas bases - no interior, por exemplo.
“O poder legislativo estadual, nos últimos anos, tem dado péssimos exemplos. Entre eles, a decisão de aumentar o recesso do meio do ano de 15 para 30 dias. Agora, pretende reduzir os dias de sessão legislativa de três para apenas dois”, diz Santiago.
“Além disso, segundo pesquisa publicada, o legislativo estadual tem sua imagem fortemente associada ao chefe do Poder Executivo. Trata-se de um poder que custa caro aos contribuintes e que, especialmente em um momento de crise, deveria buscar melhorar sua relação com a população. No entanto, essas ações apenas geram mais desgaste para a instituição”, complementa o analista.
Em 2021, a Câmara Municipal de Manaus (CMM) suspendeu uma licitação para alugar 41 picapes de luxo que seriam utilizadas pelos vereadores integrantes da mesa diretora e por presidentes e vices de comissões da Casa. O recuo ocorreu após dois vereadores de oposição, Rodrigo Guedes (Republicanos) e Amom Mandel (Cidadania), denunciarem a tentativa de contratação do serviço.
À época, a alegação do presidente da CMM, vereador David Reis (Avante), era de que a suspensão era necessária para “adequação no Termo de Referência e Edital”. No entanto, o fim do processo ocorreu após repercussão negativa da proposta perante a população - especialmente nas redes sociais.