Registro feito pelo produtor audiovisual e pianista, Expedito Calixto, repercutiu nas redes pela beleza da coruja, assim como pelo mito da velha agourenta
Registro feito pelo produtor audiovisual e pianista, Expedito Calixto (Foto: Expedito Calixto)
No Bumbódromo de Parintins (município distante 369 quilômetros em linha reta de Manaus) as lendas indígenas e caboclas ganham forma e movimento em gigantescas alegorias e na arena o imaginário ganha cor, dança e toada. Nessa semana uma lenda viralizou nas redes sociais pelo registro em vídeo do produtor audiovisual e pianista do coral do Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro, desse município, Expedito Calixto, de uma Rasga-Mortalha ou Coruja-de-Igreja (Tyto fucata), ou para aqueles que temem a própria Matinta Perêra.
Calixto contou ao acritica.com nesta sexta-feira (8) que tocava ao piano Refrão de Bolero, canção do Engenheiros do Havaí (1987), por volta das 7h55 de quarta-feira (6), em uma sala dentro do liceu em aquecimento para o ensaio do coral das crianças daquele dia. Ao olhar para fora da sala por meio do vidro transparente, se deparou com a coruja com os olhos semicerrados como se estivesse prestes a dormir. Um vidro transparente separa o pianista do animal que estava confortavelmente em pé no parapeito.
O pianista relatou a uma médica veterinária, amiga próxima dele, que havia se deparado com a coruja e os movimentos que o animal fez.
Ao que tudo indica a coruja mora no liceu parintinense e outras aves também fazem da estrutura do Bumbódromo a própria morada.
Mário Cohn-Haft, ornitólogo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), declarou que é preciso se preocupar com o efeito negativo que o homem pode causar no animal.
Para o pesquisador é incomum ver coruja dessa espécie pela manhã, uma vez que possui hábitos noturnos. “A maioria das espécie de coruja são noturnas. Existem algumas espécies ativas durante o dia e igualmente durante o dia e noite. Essa espécie é de fato noturna. Não é comum vê-lo ativo durante o dia”, disse. “O mais importante não ter medo do animal, e entender que ele tem muito mais medo da gente do que nós dele. Tentar manter distância e não ameaçar a criatura”, ponderou o ornintólogo.
A ave é rodeada de mistérios e possui algumas versões para a lenda. No norte do Brasil, a Rasga-Mortalha ou Suindara (nome vernacular brasileiro), é sinônimo de mau agouro. A lenda fala sobre uma velha bruxa chamada Matinta Perêra que visita as casas dos povos ribeirinhos para atormentar os sono dos moradores e se transforma na coruja para emitir um assobio medonho que, segundo a lenda, é presságio para a morte. Para que ela siga o próprio caminho e deixe os moradores em paz, o caboclo precisa ofertar fumo e café.
O antropólogo brasileiro Câmara Cascudo (1898-1986), sobre a Matinta Perêra escreveu. “À noite, se transforma em um pássaro agourento que pousa sobre os muros e telhados das casas e se põe a assoviar, e só para quando o morador, já muito enfurecido pelo estridente assovio, promete a ela algo para que pare. Assim, a matinta para e voa, e no dia seguinte vai até a casa do morador perturbado para cobrar o combinado. Caso o prometido seja negado, uma desgraça acontece na casa do que fez a promessa não cumprida".
Na arena parintinense, a lenda também tomou forma. Em 2018, o boi Garantido com o tema “Auto da Resistência Cultural” apresentou a metamorfose da velha Matinta Perêra na grande coruja, em uma alegoria assinada pelo artista Roberto Reis, que atualmente atua no boi Caprichoso. A toada “Matinta” composta por Enéas Dias, João Kennedy e Marcos Moura retratam o temor do mau agouro da velha bruxa. “Leve o tabaco, mas poupe minha vida. Sussuram caboclos em superstição. É preciso escapar!”, diz a toada.