OPINIÃO

Eleições e emergência climática

Pesquisadores indicam que é preciso reconhecer que há pontos de não retorno cada vez mais perceptíveis e próximos

Por Ivânia Vieira
02/10/2024 às 11:45.
Atualizado em 02/10/2024 às 11:45

Produtores de banana da comunidade do Pesqueiro, em Manacapuru, carregam cachos da fruta no leito do rio Solimões (Michael Dantas / AFP)

O tema “Emergência Climática e Saúde dos Povos da Amazônia – Diálogos em tempos de eleições”, mobilizou uma porção de gente para um encontro em 28 de setembro, o dia todo, no Centro de Formação da Arquidiocese de Manaus (CEFAM). 

Para o local foram agentes de pastorais socais, professores, pesquisadores, estudantes, representantes de coletivos de mulheres, de religiões de matriz africana, do movimento negro, indígenas. Expositores convidados apresentaram dados de pesquisas e fragmentos do cotidiano das agonias em Manaus e outros municípios do Amazonas.

Escutar, falar e propor reação era a proposta desenhada. Assim, entre escutas, depoimentos, desabafos e perguntas a reunião apresentou, ao final, uma fotografia em processo lento de revelação e de compreensão: impacto profundo na vida provocado pelos eventos climáticos extremos, pelos atos humanos criminosos e a omissão de governos e de instituições sem ignorar a parte que cabe à sociedade. 

Nesses relatos, as pesquisas demonstram alguns dados do estrago feito e pesquisadores voltaram a indicar a necessidade de reconhecer que alguns pontos de não retorno estão cada vez mais perceptíveis e próximos; a contínua violência exercida contra povos de terreiro ampliada em agudização de crises e de campanhas políticas; o preço para adquirir água potável determinando quem pode comprar e quem não pode comprar.

O fim dos quintais e de áreas de fragmentos da floresta urbana destruídos pela voracidade da especulação das terras é sentença de vida apertada, asfixiada e de gradativa perda de saberes e de conhecimentos. As plantas dos quintais e das áreas de vegetação, como laboratório vivo para fins medicinais e de segurança alimentar, estão desparecendo e, com elas, hábitos de convivência entre gente/planta/terra, formas de uso, aprendizados e descobertas das outras vidas que nelas e por elas vivem. 

Os peixes, em fartura, movimento as águas do rio Solimões ao ponto de ‘caírem’ na canoa, como relatou uma jovem tikuna, há meses sumiram. A água contaminada matou tantas vidas e, escassa, virou lama em alguns pontos, noutros a terra rachou. “Eu tentei muitas vezes o apoio das autoridades, dos políticos para socorrer nosso povo, com as emendas parlamentares, ouvi que o dinheiro era para o bioma amazônico. Nós não somos esse bioma? O que é esse bioma sem nós?” indagou em prantos a jovem.

São questões deixadas de lado nas campanhas eleitorais deste ano. Os programas apresentados em horário eleitoral estão, na maioria, descolados da emergência climática local. Prevalecem métodos velhos de uma prática eleitoral de compra de voto dos eleitores, atualizada pelo PIX, da violência e de exibições machistas.

Nesse modelo da fazer campanha eleitoral, a Natureza e a emergência climática não cabem como pontos de proposta. As palavras-chave são segurança pública à base de bala, atacar, mentir e desrespeitar o conjunto de eleitores. 

O encontro no CEFAM quer outro caminhar entre política, eleições e emergência climática. Dele sairão propostas para o agir local. É o que apontam os envolvidos na organização e na realização desse espaço de diálogos promovido pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), com apoio do Movimento das Mulheres Negras da Floresta (DANDARA), Instituto Equit, Cáritas Arquidiocesana de Manaus, SARES, Vozes pela Ação Climática e Fórum Permanente de Mulheres de Manaus (FPMM).

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