Há naturalização e legitimação de atitudes que só se justificam pelo autocracismo peculiar nesse território
Imagem criada com inteligência artificial no app Dall-e2 (Dall-e2)
O tempo e o espaço da Amazônia no mundo carregam marcas das batalhas travadas nas águas, nas terras firme e de várzea, no mais profundo das florestas e nas urbanidades das cidades da região. São batalhas, na maioria delas, silenciadas nos relatos históricos ou significadas pelo olhar do dominador etiquetando-as noutra versão.
Com frequência as etiquetas, como sínteses do pensamento clássico, desfilam nas salas de aula da infância àquelas das universidades. São acionadas nos trabalhos de conclusão de curso, das dissertações e teses, reforçam, formam e reformam o molde pelo qual a Amazônia é representada no Brasil e no mundo.
Tantas realidades e histórias permanecem fora do molde hegemônico. Delas, no máximo, são capturados microfragmentos por vezes utilizados para endosso de determinados posicionamentos científicos nos quais estigmas – como recursos dos métodos e das metodologias – ganham realce e estabelecem padrões para os humanos, os não humanos e a região do universo amazônico.
A democracia enquanto arranjo ateniense na primeira invenção e, na segunda, pelos europeus modernos, se estabelece como movimento e ou conjunto de atitudes posicionados/posicionando-se em relação a ideia de autocracia. Por isso, para alguns estudiosos, democracia é uma brecha aberta e fechada em vários momentos, alargada ou estreitada. Reivindica viver, aprender, expandir experimentos sociopolíticos e econômicos mais largos em níveis globais/locais.
Na Amazônia, o experimento democrático, se utilizado como um dos parâmetros de enquadramento, reivindica ser profundamente enlarguecida no confronto com os modelos autocráticos vigentes no interior da região. Há naturalização e legitimação de um conjunto de atitudes que só se justificam pelo autocracismo peculiar desenvolvido nesse território a partir das invasões, dos roubos, dos saques, do genocídio contínuo, e da tomada de terras, dos rios e dos lagos.
É na exigência desse enlarguecer o experimento democrático enquanto movimento que a democracia na Amazônia se apresenta como emergência tantos nos espaços escolares quanto nos das organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais. A modelagem principal em que é pensada e desenvolvida a região impôs, a ferro, fogo e bala, um poder e, por meio dele, o pensamento truculento e racista gerador do atual cenário. Persiste a ideia em ação da subalternidade e, com ela, da tutelagem sobre as gentes amazônicas e suas maneiras de relacionarem-se com os bem da Natureza.
A governança e a governabilidade se aproximam e agem na definição de um macro projeto de assujeitamento dos povos amazônicos. A rede tecida funciona bem para assegurar que o sistema seja mantido e se reproduza como algo novo nos discursos dos agentes públicos, dos representantes do executivo, do legislativo e do judiciário. A institucionalidade funciona como programadora e reprogramadora desse projeto agora concebido como plano executado e em execução.
As eleições municipais deste ano são possibilidades concretas para alargar ou estreitar o experimento democrático na/da Amazônia.