Para o secretário de Meio Ambiente do Amazonas, a mineração faz parte de uma agenda cada vez mais efetiva para a transição climática. Ele representará o estado na COP 29, que começa segunda no Azerbaijão
(Foto: Facebook/Perfil do secretário)
Para o secretário de Meio Ambiente do Amazonas, Eduardo Taveira, a mineração será uma agenda cada vez mais efetiva para a realização da “transição climática”, se referindo ao movimento de redução da dependência dos combustíveis fósseis, um dos principais vilões da crise dos climas extremos.
A defesa da atividade, embora abra divergência com o que dizem parte dos ambientalistas, vai na linha da posição adotada pela gestão Wilson Lima, que criou, no ano passado, a Secretaria de Mineração e Gás, em meio ao apoio público a dois projetos em andamento no Amazonas: a exploração de potássio em Autazes e de gás natural em Silves. Ambos são questionados judicialmente.
Taveira será o representante do Amazonas na 29ª edição da Conferência das Partes (COP), principal evento da ONU e do mundo sobre clima. O estado prepara o anúncio de um decreto que oficializará a meta de zerar o desmatamento líquido zero até 2030, promessa apresentada no ano passado. Confira a entrevista.
O Amazonas vai estar presente em mais uma edição da COP, desta vez no Azerbaijão. Qual agenda o estado leva neste ano?
A gente tem um desdobramento muito importante da última COP, a de Dubai, que é o Amazonas 2030. É um comprometimento do governo do estado com a redução do desmatamento no Amazonas, atingir o desmatamento zero líquido até 2030. Nós lançamos esse programa, lançamos a fonte de financiamento para esse programa, vinculado aos programas de REED+ do estado, e neste ano, a gente está adiantando aqui, em primeira mão, que o governador vai assinar um decreto para instituir uma política de atingimento dessas metas e as bases desse plano.
Esse plano é uma construção que foi feita desde a COP do ano passado, com investidores, parceiros, que acabaram pedindo do governo do Estado que esses compromissos fossem ratificados. Nessas conversas que a gente está tendo ao longo do ano, a maioria dos parceiros, investidores, pediram que esse programa lançado em Dubai pudesse ter um peso de lei, de decreto. E assim vai ser feito. A gente vai levar esse decreto assinado para divulgar lá durante a COP.
O programa lançado pelo governo no ano passado, Amazonas 2030, prevê a compensação de impactos do desmatamento líquido até 2030, e essas ações seriam custeadas por vendas de decreto de carbono, de estoques que o estado adquiriu entre 2006 e 2015, quando houve redução de desmatamento. Avançou neste um ano após o anúncio do programa?
A gente conseguiu lançar o edital com os projetos em unidades de conservação. A gente começa agora as consultas públicas das propostas que foram elegidas. E 50% desse orçamento da venda dos créditos são para o Fundo Estadual de Mudanças Climáticas.
Esse Fundo Estadual de Mudanças Climáticas é fundamental para a gente poder investir nessas áreas do programa Amazonas 2030. Outro programa também que avançou, também baseado em REED+, são os projetos que a gente está lançando do sistema jurisdicional, que são créditos de alta integridade que vão ser produzidos. Já a partir de 2025, a gente está no segundo ano consecutivo de redução e desmatamento, e a gente está fazendo as negociações da venda antecipada desses créditos também.
A gente queria levar até para a COP agora, mas a gente vai segurar um pouco por causa justamente das fases relacionadas à consulta livre às populações que eu havia informado. Mas é bem provável que a gente já volte da COP do Azerbaijão com um indicativo a respeito da quantidade de créditos do sistema jurisdicional, já negociados para que a gente possa também financiar o Amazonas 2030. Está muito dependendo desse decreto.
O governo disse no ano passado que, para 2024, havia a previsão de arrecadar R$ 1 bilhão com a venda desses créditos. É esse mesmo programa que o senhor está explicando?
Isso, esse mesmo. Na verdade, a gente já fez o anúncio prévio de parte desses créditos por meio dos projetos que agora obviamente estão em desenvolvimento nas unidades de conservação, na fase da consulta pública. E esse acordo prévio que a gente está tentando trazer agora da COP de Baku é com a venda antecipada dos créditos de alta integridade.
Então essa transação não ocorreu ainda, essa previsão de arrecadar R$ 1 bilhão?
Não, não, não. Não é assim de uma hora para outra. Essas estratégias de desenho para financiar a agenda de mudanças climáticas é muito recente no mundo. O que o estado do Amazonas está fazendo, outros estados também estão escolhendo outros caminhos. O Pará anunciou também vendas de créditos, assim como Tocantins, Acre, Mato Grosso.
Todos nós estamos escolhendo caminhos similares, mas estratégias diferentes. Mas o que dá mais trabalho na construção desses modelos é toda essa segurança técnica legal. Para que a gente possa ter a operação correndo sem nenhum tipo de problema e dar uma garantia também para os compradores a respeito da segurança jurídica em todas essas transações.
Quem deve comprar esses créditos e quem deve receber? À primeira vista, claro, o recurso vai para o governo, mas a gestão destinará a quem?
Todos os recursos de rede vão beneficiar diretamente esse fundo de mudanças climáticas do Amazonas e a outra parcela, 50%, vai ser direcionada para as comunidades de onde os créditos foram obtidos. Essa repartição de benefícios já está prevista na nossa Lei de Serviços Ambientais e também no decreto de REED+ que a gente fez em 2022.
Neste ano, houve recorde de queimadas no Amazonas desde o início da série histórica. Pelo segundo ano, ficamos cobertos por fumaça. O que o governo diz é que mais da metade desses focos ocorrem em áreas federais, e isso é fato, mas não deveria haver uma atuação conjunta do governo estadual? E os focos em áreas estaduais? Por que os incêndios aumentaram?
Vou começar pela última pergunta. Aumentou no mundo todo, aumentou no Brasil todo e aumentou porque a gente está passando por um período de extremo climático vinculado à seca. Quanto mais seca, mais disponibilidade de área para você queimar.
Com essa mudança de duas secas seguidas, o próprio ecossistema na sua composição também muda. Então, por exemplo, a gente teve um aumento, que eu acho que esse é o dado que a gente fica mais preocupado, de incêndios em área de floresta, não só em área destinada para limpeza de terreno, para pasto, para gado, para soja, como era mais comum nos últimos anos. Isso porque a floresta tem ficado muito seca e antigamente a floresta tropical úmida era a barreira contra o avanço desses incêndios.
Por causa da seca mais persistente, pela primeira vez, até os bombeiros estão mudando o trabalho que estão fazendo e adquirindo novos equipamentos para lidar, por exemplo, com incêndio de copa de árvore. A gente nunca teve incêndio de copa de árvore. Esse é um elemento que torna tudo mais difícil.
Um outro ponto é que a maior área de pressão continua ao sul do estado do Amazonas e, como você falou, quase 90% das áreas que sofrem essa pressão são áreas federais, em especial assentamentos do Incra. Então, a gente tem trabalhado em conjunto com o Ibama, com o ICMbio, para que a gente tenha uma estrutura de atendimento que possa cobrir essas áreas prioritárias, tanto é que o estado está com um programa para apoiar brigadistas dentro dos municípios, desses municípios prioritários, para que a gente possa fazer o combate em tempo real. Foi aprovado também agora o projeto do Amazonas para o Corpo de Bombeiros e a Fundo Amazônia, R$ 45 milhões, para que o bombeiro possa estabelecer as bases.
A gente tem esperado que esse sistema de seca seja um sistema que vai persistir pelo menos por mais de dois ou três anos, ou seja, com aumento significativo de novo em relação às queimadas. Apesar dos aumentos que a gente está tendo, o Estado demonstrou que está mais preparado para lidar com essa situação. A gente teve ano passado períodos críticos de quase três meses enfrentando problemas de fumaça e a gente conseguiu reduzir esse período a 15 dias esse ano.
O senhor falou sobre o aumento dos incêndios associado à crise climática. Qual a atenção do governo para isso? Temos plano de ação climática sendo trabalhado?
Já há diretrizes, já há ação efetiva do combate a essas questões da crise de emergência climática.
O governo do Amazonas, por meio do IPAM, está sendo alvo de ações judiciais pelo MPF por acusação de atropelo de licenciamento e de não respeito à consulta de indígenas em dois projetos que são apoiados pelo governo. A exploração de potássio em Autazes e a de gás natural em Silves. Isso não gera uma contradição com essa agenda que o governo está levando para a COP?
Acho que são duas demandas. Obviamente a questão dos detalhes técnicos precisa ser vista com o Ipaam, agora, a posição da Secretaria de Meio Ambiente é que a gente vai ter que encontrar um caminho para essas atividades, porque elas são atividades que, inclusive, estão vinculadas a uma agenda de mineração que é portadora de um futuro que todo mundo vai discutir. Porque se a gente está falando de eletrificação, se a gente está falando de combustível de transição, se a gente está falando de recuperação de área degradada, as áreas que vão sustentar essas atividades de futuro, elas têm base na mineração. Tem o gás natural, ela tem o potássio, ela tem outros minerais vinculados à agenda de descarbonização e eletrificação.
Isso é uma pauta que vai ter que ser colocada e vai ter que ser encampada, senão a gente não consegue as metas de descarbonização. Esse é o mundo real. A mineração é, sim, uma pauta que vai ser uma agenda cada vez mais efetiva para a transição climática.
Em relação à questão do licenciamento, as regras do licenciamento são muito claras. E além de ser claras, o licenciamento no bioma Amazônia talvez seja um dos mais pesados do mundo do ponto de vista de proteção às questões ambientais, sociais. Até onde eu sei, todos os requisitos relacionados ao cumprimento da legislação ambiental e dos licenciamentos para atividade econômica no Amazonas estão sendo rigorosamente cumpridos pelo Ipaam.
A COP 30, que acontecerá em Belém no próximo ano, é considerada a mais importante dos últimos anos. Como vai ser a participação do Amazonas?
Vejo esse papel da união dos estados da Amazônia Legal simbólico, do ponto de vista das agendas que a gente vai encampar. E o ponto que o estado do Amazonas está mais se preparando em relação a isso, sem dúvida, é o financiamento dessa agenda climática. A gente tem uma conta que a gente trabalha aqui na Secretaria de Meio Ambiente, que se para a gente fazer um programa de implementação, de adaptação às mudanças climáticas, só com as comunidades diretamente afetadas pelas mudanças climáticas, é uma conta que chegaria a mais ou menos um bilhão de reais por ano até 2030. Para o Amazonas, essa é a agenda principal.