Burocracia

Produção orgânica sofre com a baixa adesão às linhas de crédito disponíveis

Pesquisa aponta os obstáculos que impedem os agricultores familiares de acessarem recursos essenciais

Lucas Vasconcelos
cidades@acritica.com
08/09/2024 às 16:05.
Atualizado em 08/09/2024 às 16:05

Adriana Oliveira é engenheira agrônoma e trabalha com sistemas agroflorestais (Divulgação)

A produção orgânica de alimentos no Brasil enfrenta um desafio significativo: a baixa adesão às linhas de crédito disponíveis, especialmente aquelas vinculadas ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Um estudo recente da Universidade de Brasília e da Embrapa Cerrados, que mapeou 2.325 produtores, apontou que o desconhecimento e a burocracia são os principais obstáculos que impedem os agricultores familiares de acessarem esses recursos essenciais.

Os dados revelam que 29% dos agricultores consideram a falta de financiamento como o principal empecilho para adotar práticas de cultivo orgânico. O estudo revelou que 42% dos produtores não tentaram obter crédito rural, e 50% apontaram o alto grau de complexidade e esforço necessário para a contratação de operações de crédito como uma barreira intransponível. A pesquisa, publicada na “Revista Desenvolvimento e Meio Ambiente”, evidencia uma lacuna entre as políticas de crédito e a realidade dos pequenos produtores.

Entre os entrevistados, a maioria, composta por produtores familiares, utiliza recursos próprios para suas atividades. A pesquisa também mostrou que, entre aqueles que conseguiram algum tipo de crédito, apenas 26% conseguiram financiamento específico para orgânicos, enquanto 74% optaram por linhas de crédito tradicionais. A falta de conhecimento sobre as opções de crédito e a percepção de maior burocracia foram citadas como as principais razões para a escolha de linhas não específicas.

Essa realidade é refletida na experiência de produtores como Adriana Oliveira, uma engenheira agrônoma de Manaus, que trabalha com sistemas agroflorestais e se interessou pela agricultura desde a infância, aos 10 anos, por vir de uma família de agricultores.

“[...] foi a influência familiar, principalmente dos avós, tanto maternos quanto paternos. Todos criados em área rural e com vivência nesse meio. Acabei crescendo com histórias e com um pezinho no meio rural. Eu trabalho com sistemas agroflorestais, não são produtos orgânicos com selos e afins. Essa parte agroflorestal visa uma dinâmica e interação maior com a floresta em pé e os meios que ela oferece”, descreveu Adriana.

Burocracia e desafios

A produtora rural relata a dificuldade em obter créditos rurais por conta da dificuldade de obter documentos. “Sim. A parte orgânica requer burocracia do Estado, fiscalização e afins. Envolve muito mais critérios”, afirmou Adriana.

Ela ressalta que, embora sua produção não se concentre exclusivamente em produtos orgânicos com certificação, a complexidade dos processos ainda impacta sua atividade. Além da burocracia, Adriana também enfrenta desafios logísticos significativos. A produção e comercialização de seus produtos, que incluem frutas e castanhas, dependem de transporte fluvial, o que encarece os fretes e dificulta o acesso ao mercado consumidor.

“O processo agrícola requer planejamentos e manutenção em campo (limpeza, roçagem, adubações) para assim conseguir uma boa colheita. O produto é colhido, higienizado e embalado para a comercialização. Faço a comercialização local ou trago para a capital. Uso as redes sociais para divulgar os produtos. A logística, essa parte é 100% fluvial até Manaus. Fretes altos, mão de obra escassa, condições climáticas (verão intenso). Há também os desafios no mercado: procuro sempre agregar valor ao produto que comercializo para conseguir um preço justo para mim (produtor) e para o consumidor também”, relatou a produtora rural.

Os resultados do estudo sugerem a necessidade urgente de uma reformulação nas políticas de crédito para a agricultura orgânica. Ariel Luiz de Sales Gomes, coautor da pesquisa, defende que uma abordagem holística é fundamental para promover um desenvolvimento rural mais justo e sustentável. “Precisamos simplificar os processos, oferecer assistência técnica especializada e aumentar a divulgação das opções de crédito disponíveis”, conclui.

Estudos de caso

A pesquisa também indica que próximos passos incluem a realização de estudos de caso em diferentes regiões do Brasil para entender melhor as necessidades locais dos agricultores e buscar soluções que respeitem as particularidades sociais e culturais dos produtores familiares. Assim, será possível criar um ambiente mais favorável ao crescimento da agricultura orgânica e, consequentemente, contribuir para a segurança alimentar e a sustentabilidade no país.

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