Lei sancionada

Evitar o uso do celular na sala de aula será desafiador, afirma pesquisadora

Fabiane Garcia frisou que o controle e educação dos estudantes não dependem unicamente dos professores e escolas

Emile de Souza
politica@acritica.com
19/01/2025 às 09:55.
Atualizado em 19/01/2025 às 09:55

Lei federal restringe o uso do celular na escola a situações de estado de perigo, para fins estritamente pedagógicos e para garantir acessibilidade e inclusão (Foto: Divulgação)

A pesquisadora em tecnologia educacional da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Fabiane Garcia afirma que a lei federal que restringe o uso de celular em sala de aula  é um suporte para os professores, mas evitar o uso dos aparelhos será desafiador por estar relacionado a uma “compensação familiar” para ocupar as crianças e adolescentes. 

Na última segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o projeto de lei que regulamenta o uso desse equipamento eletrônico nas escolas públicas e privadas de todo o país.  

“Infelizmente, o uso de muitos equipamentos tecnológicos se tornou uma espécie de compensação das famílias para nossas ausências”, afirmou a educadora.

Garcia ressaltou que a medida irá contribuir na regulamentação, mas que o controle e educação dos alunos não depende unicamente dos professores e das escolas. 

Pesquisadora da Ufam Fabiane Garcia ressaltou que a redução do uso do celular é necessária para a construção social dos estudantes.

 “Pensar em educar uma criança é um compromisso de toda a sociedade e não só da escola, mas certamente a escola pode ser o melhor lugar para nos ajudar a indicar qual o melhor caminho a seguir. A lei nos apoia naquilo que já vínhamos preconizando, a tecnologia é imprescindível para os processos de aprendizagem, mas seu uso não substitui ou se equipara às relações sociais que estabelecemos entre os diferentes sujeitos no interior de uma escola”. 

Restrição

De acordo com a lei, a proibição fica estabelecida não só para as salas de aula, mas no recreio e intervalo entre as aulas. A proibição vale para a educação infantil e os ensinos fundamental e médio.  Será permitido usar o celular somente em situações de estado de perigo, de necessidade ou caso de força maior, para garantir direitos fundamentais, para fins estritamente pedagógicos e para garantir acessibilidade, inclusão, e atender às condições de saúde dos estudantes.

Conforme publicado, o objetivo é salvaguardar a saúde mental, física e psíquica das crianças e adolescentes. A educadora Fabiane Garcia explicou que as regras podem ajudar no desenvolvimento social e psíquico dos jovens. 

“Acreditamos que sim, a comunidade científica têm alertado que o uso das tecnologias nos ajuda nos processos de aprendizagem, em especial em processos de acessibilidade, mas o uso da mesma para a socialização, mesmo com a presença efetiva de nossas crianças e jovens em redes sociais, não tem se mostrado saudável”, destacou.

Fabiane Garcia ressaltou que a redução do uso do celular é necessária para a construção social dos estudantes. 

“Esperamos que nossas escolas continuem sendo esse espaço de construção de aprendizagem, de amizades e de relações que dão sentido e significado à vida social que estamos construindo coletivamente”, afirmou.

Leis não pegaram

Apesar da aprovação da lei ser considerada positiva, o diretor do Sindicato dos Professores e Pedagogos de Manaus (Asprom-Sindical), Lambert Melo, informou que a lei precisará ser regulamentada, para não acontecer o mesmo que nas legislações estaduais, que não foram cumpridas por falta de suporte aos professores e às escolas. 

“É um assunto que para nós, do estado do Amazonas, já é antigo, porque nós, os educadores, já reclamávamos há bastante tempo dessa questão e, felizmente, nós já tínhamos leis aqui que buscavam fazer essa proibição. No entanto, essas leis locais, tanto a estadual quanto a municipal, elas nunca foram totalmente viabilizadas”, disse.

Coordenador da Asprom, Lambert Melo, afirmou que, se não houver regulamentação, a lei federal acabará sendo esquecida como foi a lei estadual

 Segundo o texto aprovado, as redes de ensino e as escolas deverão elaborar estratégias para tratar do tema do sofrimento psíquico e da saúde mental dos estudantes da educação básica, informando-lhes sobre os riscos, os sinais e a prevenção do sofrimento psíquico de crianças e adolescentes, incluídos o uso imoderado dos aparelhos.

Lambert Melo explicou que um dos motivos das leis estaduais não terem sido efetivas foi a falta dessas regulamentações e de como seriam cumpridas as determinações. 

“Primeiro, por conta de que elas necessitavam de regulamentação dos poderes executivos e essa regulamentação acabou não acontecendo, sobre o detalhamento de como que essa proibição seria efetivada nas escolas e, portanto, o cumprimento dessa legislação foi algo sempre bastante difícil nas escolas públicas principalmente, tanto da rede estadual quanto da rede municipal”, ressaltou.

Para a efetivação da lei federal, o professor afirmou que será “desafiador” pelas questões de suporte no cumprimento da lei e de como funcionará na prática. 

“Essa dificuldade que nós já enfrentávamos com as leis locais, elas vão continuar existindo, porque, obviamente, é necessário que a lei federal também seja regulamentada para que você possa ter ali todo um aparelhamento das escolas públicas no sentido de fazer com que, de fato, esses alunos não levem esses telefones e esses equipamentos eletrônicos para as salas de aulas”. 

Lambert Melo criticou, ainda, a atuação dos poderes executivos em investirem em produtos tecnológicos de forma massificada. Segundo ele, desde que os aparelhos celulares se popularizaram, “prejudicaram profundamente” o aprendizado dos estudantes. 

“Nós somos sabedores de que governos estaduais e municipais pelo Brasil buscaram fazer parcerias com empresas de tecnologia para se utilizar dessas tecnologias dentro das escolas, fazendo um desvio de verba pública muito grande.” 

Ele ressaltou que essas empresas têm um lobby muito forte e buscavam vender seus produtos tecnológicos para as prefeituras, para os governos dos estados. “Isso aconteceu aqui também em nosso estado do Amazonas e na nossa cidade de Manaus, houve uma enxurrada desses produtos que foram contratados, comprados pelo governo do estado e pela prefeitura de Manaus, por isso também é que a dificuldade de combater a utilização sempre foi grande”, pontuou. 

'Não funcionam por decreto'

Outro desafio para o cumprimento da lei foi destacado pela presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado do Amazonas (Sinteam), professora Ana Cristina, que afirmou que a eficácia da legislação pode ser comprometida caso não haja um esforço por parte das famílias.

“Considero a lei um avanço, mas tem coisas que não funcionam por decreto. Esse é um exemplo”, disse. 

Presidente do Sinteam, Ana Cristina, disse que é preciso esforço da Família e do Estado para que a nova lei tenha eficácia

 A professora informou que caso não haja empenho das famílias e do Estado, será mais uma atribuição dada aos educadores. 

“Infelizmente, essa deverá ser mais uma tarefa para os professores que vão continuar disputando a atenção do aluno com o telefone caso não haja conscientização de toda a sociedade para o prejuízo que o excesso de telas causa no cérebro das crianças e adolescentes, passando pelo processo de aprendizagem”, ressaltou Ana Cristina.

Lei estadual esquecida

O Amazonas tem uma lei em vigor, a nº 3.198, de 4 de dezembro de 2007, que proíbe o uso de  celular dentro das salas de aula nos estabelecimentos de ensino da rede pública e privada de educação do Amazonas.  O uso do telefone, por alunos das redes pública e particular de ensino, seria permitido nas demais áreas comuns das escolas. No entanto, na prática, não funcionou.

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