Jogos Paralímpicos

Como o esporte transformou a vida de Elielton Oliveira, um dos amazonenses que estará em Paris

Através do esporte, o amazonense Elielton Oliveira ressignificou sua trajetória e agora ele disputará os Jogos Paralímpicos

Camila Leonel
camilaleonel@acritica.com
25/08/2024 às 16:45.
Atualizado em 25/08/2024 às 16:45

Weshington Alves foi medalhista de prata nos Jogos Parapan-Americanos de 2023, no Chile (Washington Alves/CPB)

Judô vem do japonês, que significa ‘caminho suave’. A modalidade desenvolvida por Jigoro Kano foi batizada assim por conta da técnica que visa a inteligência acima da força física, mas no caso do amazonense Elielton Oliveira, a arte marcial realmente transformou a caminhada dele em algo mais suave. Mais do que isso: trouxe vitórias que o colocaram nos Jogos Paralímpicos de Paris 2024, competição que ele disputará pela primeira vez aos 28 anos.

Nascido em Manaus, o atleta cresceu no bairro Tancredo Neves, zona Leste da capital amazonense. Aos 12 anos, ele perdeu a visão após levar um tiro na cabeça, que o fez perder o globo ocular. Foi no esporte que ele encontrou uma ocupação, e uma chance para abandonar o vício em álcool e entorpecentes. 

Elielton competindo no Mundial da modalidade no Azerbaijão

 Mas antes de chegar nos tatames, Elielton começou pelas piscinas, mas não conseguiu levar adiante por conta do vício em cigarro, De lá, ele foi para o atletismo, onde chegou a se destacar nos Jogos Escolares. Mas quando tudo parecia estar dando certo, veio outro baque na vida do atleta: a morte da mãe.

“Quando perdi minha mãe, desanimei do esporte, passei um bom tempo sem treinar. Depois, conheci um amigo que treinava jiu-jítsu e me convidou. Foi quando voltei ao esporte e me encontrei na luta. Gostei, passei a treinar duas, três vezes por dia. Nas competições, o pessoal começou a ver que eu tinha talento e eu recebi a proposta para morar na Vila Olímpica e treinar judô. Até então, não sabia que existia o judô paralímpico, pensava que existia apenas o jiu. Experimentei, achei um esporte bem difícil de aprender e me apeguei a isso. Passei a treinar os dois e, depois de uma época, percebi que tinha de focar em apenas. Foi quando escolhi o judô e não parei mais”, relembrou.

Elielton durante treinamento com a seleção brasileira de judô

 Enquanto tomava gosto pelo esporte, Elielton resolveu abandonar os vícios e se dedicar na modalidade para chegar longe. A partir daí ele foi morar na Vila Olímpica de Manaus, onde ficou por sete anos.

“Foram momentos bem importantes para a minha carreira. Tinha um professor que, quando não ia ninguém treinar judô comigo, ele fazia um treino específico para mim e ficávamos apenas nós dois treinando. Isso somou bastante para eu hoje estar em Paris. Eu não tinha kimono, então acabava ganhando de alguns amigos que não usavam mais. Alimentação, como eu sempre estava na academia, acabava almoçando ou jantando junto. E quando chegava na competição, o pessoal queria ver eu lutando, então aparecia alguém para bancar a inscrição”, disse Elielton refletindo, antes de completar.

“Meu apoio era esse, de poucos amigos que eu tinha ao meu redor. Então, esse período na Vila foi muito bom para mim, evoluí bastante, apesar da dificuldade. As coisas aconteceram muito rápido depois que comecei a competir fora de Manaus. Quando consegui sair para competir fora, me destaquei e já fui chamado para a Seleção”.

Elielton Oliveira compete na categoria até 60kg na categoria J1, cegos totais

Novos caminhos

 Competindo fora do estado começaram a vir as dificuldades para se deslocar. Foi aí que ele decidiu se mudar para São Paulo e, assim pavimentar a trajetória para chegar nos Jogos Paralímpicos. Com bastante treino e luta, Elielton se dedicou neste ciclo para conseguir confirmar a vaga para Paris. Um sonho que logo virou algo possível e se tornou realidade.

“A gente veio para cá [São Paulo] na intenção de treinar bastante, então, a rotina aqui tem sido treinar de segunda a sábado duas vezes por dia. Quando o cansaço bate mais forte, a gente descansa sábado e domingo. O objetivo era esse, vir pra treinar muito e brigar por uma vaga nos Jogos Paralímpicos. Consegui ficar entre os sete melhores do mundo e termino o ciclo como segundo melhor do mundo. Então, a rotina era essa: treino. E veio o resultado”, explicou.

Elielton compete na categoria ligeiro (-60kg) na classe J1, cegos totais. Em 2022, o amazonense passou a integrar a seleção brasileira adulta e entre as conquistas neste ciclo olímpico estão uma Prata na categoria até 60kg nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago 2023; prata no Pan-Americano do Canadá 2022. Além disso, ele conquistou medalha de ouro no Grand Prix de Almada, em Portugal, em 2023, e prata no Grand Prix de judô paralímpico de Antalya (Turquia), em 2024. Com o objetivo concretizado, o foco agora é brigar por uma medalha paraolímpica.

“É uma sensação de dever cumprido. Chegar na Paralimpíada não é fácil. Passamos os últimos três anos brigando por uma vaga com adversários duríssimos, então, a expectativa é das melhores. Quero chegar lá na minha melhor versão em busca do ouro. Estamos treinando sempre pensando no primeiro lugar”, contou o atleta que, mesmo encontrando dificuldades na trajetória, hoje traz satisfação para Elielton que viu o seu caminho mudar por conta do esporte.

“Saber que eu passei por todas essas coisas e, hoje, estou participando da maior competição do planeta, fico feliz por o esporte ter mudado o meu caráter, ter me transformado na pessoa que sou hoje, sendo exemplo para crianças, para aqueles que também têm algum vício e não conseguem sair. Para mim, é uma grande satisfação. Que eles vejam em mim que sempre podemos conquistar nossos sonhos e sermos melhores a cada dia”.

A seleção brasileira de judô viajou para Paris na última quinta-feira, onde fará a parte final de preparação. A modalidade estreia nos Jogos de Paris no dia 5 de setembro. Elielton compete no primeiro dia, com as fases preliminares iniciando às 4h (de Manaus). Além dele, também competem no dia 5: Rosi Andrade (48 kg / J1), Larissa Silva (57 kg / J1) e Thiego Marques (60 kg / J2).

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