LEI DE COTAS

STF derruba cota de 80% de vagas na UEA para alunos do Amazonas

No julgamento desta quinta-feira (19), os ministros retiraram a 'repercussão geral 'sobre o tema e não fixaram um novo percentual máximo de reserva de vagas, abrindo a possibilidade de criação de uma nova lei de cotas.

Lucas Vasconcelos
online@acritica.com
19/10/2023 às 19:11.
Atualizado em 19/10/2023 às 20:40

Vestibular marcada para o próximo fim de semana está mantido (Clóvis Miranda - 22/nov/2022)

O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a lei amazonense que reservava 80% das vagas do vestibular da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) para candidatos egressos de escolas públicas ou privadas do Estado.

Por maioria dos votos, os ministros entederam que a reserva de 80% das vagas da UEA é inconstitucional por violar a garantida que todos os cidadãos devem receber tratamento igual.

Em abril, o STF já tinha decidido, em julgamento virtual, derrubar a cota regional de 80% da universidade estadual, mas faltava definir se extinguiria de vez a modalidade ou se manteria um percentual menor.

No julgamento na tarde desta quinta-feira (19), por sugestão de Dias Toffoli, os ministros retiraram a "repercussão geral" sobre o tema, o que faria com que o caso servisse de base para análise de casos parecidos no futuro.

Na redação do acórdão, a Corte também não definiu um percentual mínimo de vagas, o que, na prática, abre a possibilidade da publicação de uma nova lei estadual sobre o tema.

Votação desta quinta-feira

Na sessão desta quinta, o ministro Alexandre de Moraes defendeu em seu voto que, embora a política de cotas adotada pela universidade tenha o objetivo de corrigir as desigualdades socioeconômicas, este tipo de reserva de vagas estaria criando uma discriminação para favorecer apenas pessoas residentes de uma região.

Moraes destacou ainda o artigo 19 da Constituição Federal, que proíbe a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios de "criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si”. A fixação da tese abriria margem para outras universidades estaduais também criarem "cotas regionais".

"O artigo 19, inciso III veda de forma absoluta isso. Uma das três vedações é criar distinções entre brasileiros ou preferências entre os entes federativos. O fato de alguém ter feito um ensino em um estado ele é tão brasileiro quanto os demais. Nós estamos pensando no Amazonas. Então São Paulo vai poder fixar percentual só para alunos que fizeram ensino médio em São Paulo", declarou Moraes.

Já o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, defendeu que possa haver um percentual por conta das particularidades de cada Estado.

Ao responder a Moraes, Barroso defendeu que não se pode diferenciar pessoas no Brasil, mas que em determinados contextos é possível, e até necessário, que se faça a diferenciação.

"O intérprete tem que fazer a leitura que eu considero constitucionalmente adequada. A Constitução veda discriminação entre homens e mulheres. Porém, se o Teatro Municipal de São Paulo está querendo contratar uma bailarina para interpretar a Julieta, ele pode restringir a candidatura apenas para mulheres. Se o Estado do Rio de Janeiro quiser fazer um show no Dia da Consciência Negra, ele pode contratar apenas grupos de pessoas negras", acrescentou Barroso.

Somando a Barroso, o ministro Luiz Fux ressaltou que a realidade do Amazonas é diferente dos demais estados, principalmente aqueles candidatos que vêm de municípios distantes da capital amazonense.

Fux sugeriu a porcentagem de reserva de vagas de 20% para estudantes que vêm do interior do Estado.

"[Minha sustentação será] aliás coincidentemente na qualidade de cidadão amazonense. A realidade é a seguinte: é muito diferente o estado do Amazonas. Quem estuda em Manaus, a própria procuradora da República sabe como é grande o Estado, quem estuda muito mais distante da capital. Deixar o critério da proporcionalidade em aberto talvez nós não consigamos alcançar o escopo que a gente pretende", pontuou Fux.

A proposta de Fux, contudo, não prosperou.

Políticas públicas

Para o ministro Gilmar Mendes, é preciso que as ações de permanência universitária para os egressos devem ser feitas por meio de políticas públicas não por meio da lei amazonense que afronta "princípios constitucionais".

Ao se manifestar nos autos, a UEA argumentou que é mantida exclusivamente com recursos estaduais, diferentemente da situação das universidades federais, cujos impostos pagos em âmbito nacional credenciam brasileiros de todas as regiões a frequentá-las.

Vestibular mantido

Neste fim de semana, serão realizados as provas do Vestibular 2023, Acesso 2024 e do Sistema de Ingresso Seriado (SIS) da UEA. A dúvida que fica entre os candidatos é se a decisão de hoje afetaria a realização das provas. Para o advogado Almir Albuquerque, a decisão do STF não vale ainda para este processo seletivo, mas que é preciso reajustar os editais para os próximos que não ocorra processos judiciais.

"Da mesma forma foi retirado a Repercussão Geral. Ou seja, a decisão que foi proferida hoje só afeta o Estado do Amazonas e este processo em análise. É importante lembrar que as demais cotas continuam valendo. Esta que era uma cota criada especificamente para nosso estado ela foi considerada inconstitucional", explicou Albuquerque.

Em nota, a UEA informou que tentará instituir uma nova legislação com o objetivo de preservar a cota regional e que atenda à decisão do STF.

"A instituição reitera, ainda, que o sistema de cotas foi, durante os últimos anos, instrumento fundamental para o ingresso de alunos da rede pública do Amazonas na universidade pública, bem como alunos oriundos de municípios do interior, democratizando o ensino superior no estado", informou a instituição.

Projeto de lei prevê cota de 50%

Um projeto de lei da deputada estadual Mayara Pinheiro (Republicanos) que estabelece 50% das vagas para amazonenses na UEA está em discussão na Assembleia Legislativa.

"Vale destacar que o percentual de 50% já atende a norma prevista na Lei Federal nº 12.711/2012. O texto do PL estabelece ainda a distribuição das vagas em 30% para candidatos de baixa renda e 20% para estudantes que concluíram o Ensino Médio em qualquer Estado da Federação ou do Distrito Federal (DF). Caso o percentual de ampla concorrência não seja preenchido, as vagas serão destinadas para os demais candidatos amazonenses", destacou a deputada.

A parlamentar ressaltou ainda que a UEA é "a esperança de estudantes interioranos e ribeirinhos em ingressar no Ensino Superior" e espera que o PL seja submetido em breve para discussão dos pares e desde já conta com o apoio do parlamento estadual para garantir mais esse direito aos amazonenses.

O caso iniciou em 2004

A cota de 80% das vagas para alunos que cursaram todo o ensino médio no Amazonas foi criada por meio de lei estadual em 2004, um ano depois da criação da UEA.

O caso foi parar na Justiça do Amazonas no mesmo ano, após um aluno que só fez o 3º ano do ensino médio ter sido desclassificado pelo critério das cotas, mesmo tendo nota suficiente para ingressar no curso de Engenharia.

Em 2009, o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) deu ganho de causa ao rapaz e a UEA recorreu ao STF.

Segundo a UEA, a política se justificaria porque os alunos do Estado estariam em desvantagem em relação a estudantes de grandes centros urbanos e que sua implementação está no âmbito da autonomia do ente federado e da universidade.

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