Cláudio Garrido recebeu o ofício de seus familiares e o exerce há mais de três décadas
Cláudio Garrido aprendeu o ofício com o pai, que havia herdado do avô. Ele se profissionalizou fazendo curso de Marcenaria no Senai. (Foto: Daniel Brandão/A Crítica)
Novo Airão (AM) – A marcenaria, profissão milenar e tradicional que resiste às intempéries do tempo, possui profundas raízes na história do município de Novo Airão (a 115 km de Manaus). Reconhecida como um dos principais destinos turísticos do Amazonas, por suas belezas naturais, cultura e folclore, a cidade também se destaca pelo povo trabalhador e humilde.
Em uma casa na rua dos Motoristas, o ofício da marcenaria é transmitido como herança familiar, de pai para filho, há mais de cinco décadas.
A CRÍTICA esteve em Novo Airão para conhecer a história de Cláudio Garrido, 43 anos, marceneiro desde os 13. Ele conta que todos os familiares trabalhavam na construção naval, mas, com a transição de embarcações de madeira para as de ferro, passaram a trabalhar com a marcenaria, e ele herdou o ofício após essa mudança.
Embora tenha recebido os ensinamentos dos pais, tios e avós, Cláudio decidiu se profissionalizar na marcenaria para continuar aperfeiçoando os conhecimentos e técnicas familiares.
“Eu já tinha a base ensinada pelos meus familiares. Então, fiz um curso de marcenaria no Senai, em 1996, para continuar me aperfeiçoando no mercado”, explica.
Cláudio trabalha com madeira há 30 anos. No início, na área da construção naval e, posteriormente, migrou para a marcenaria. (Foto: Daniel Brandão/A Crítica)
Durante os 30 anos de profissão, Cláudio lembra que enfrentou muitos desafios, mas sempre buscou formas de superá-los e preservar o legado da família.
Perguntado sobre a origem da matéria-prima de seus produtos, Garrido revelou que possui um terreno onde realiza manejo florestal e retirava madeira de forma consciente. No entanto, enfrenta problemas quanto ao licenciamento ambiental da área.
“Eu tenho uma área de manejo florestal. Por quatro anos, retirei madeira legalizada, sem degradar o ambiente. No último ano, enfrentei dificuldades com a regularização fundiária, e minha licença foi travada. Agora, estou lutando para obter o título da terra e renovar a licença ambiental. Enquanto isso, tenho comprado madeira de outras comunidades ribeirinhas que fazem o manejo florestal comunitário. Quando há madeira disponível, conseguimos trabalhar.”
A preocupação com o meio ambiente é essencial para a profissão do marceneiro. Mesmo com a baixa oferta de matéria-prima legalizada e a alta demanda por produtos de marcenaria e movelaria, Garrido preocupa-se em adquirir somente madeira de lei para produzir suas peças.
“Este ano, não estamos encontrando em lugar nenhum. Não estamos conseguindo comprar madeira legalizada. Ainda tenho um pequeno estoque que estou mantendo da última compra. Se não tivermos uma área de manejo florestal para continuar trabalhando com madeira de lei, teremos que migrar para o MDF, que não é madeira e não tem a mesma qualidade”, destaca.
Em 1996, Cláudio Garrido fez um curso de marcenaria no Senai, para continuar se aperfeiçoando no mercado. (Foto: Daniel Brandão)
Diante da demanda de serviços ser maior que a quantidade de matéria-prima de origem legal, os marceneiros e moveleiros de Novo Airão recebem assistência do Pronai, que incentiva a contratação de serviços para a produção e aquisição de móveis escolares para as escolas estaduais.
Além de ser um dos grandes marceneiros do paraíso ecológico, Cláudio Garrido é presidente da Associação dos Marceneiros e Moveleiros de Novo Airão – Itaúba (nome de uma das principais madeiras utilizadas no setor, devido à sua qualidade e durabilidade). À frente da instituição, luta pelos interesses da categoria e pelo projeto de instalação do Polo Moveleiro de Novo Airão.
“Nós já temos a área onde será instalado e o projeto para a construção desse polo, mas falta interesse público para apoiar nossa categoria”, finaliza.
Foi por meio da marcenaria que Cláudio sustentou sua esposa e filhos. Por seu ofício e história de vida, ele reconhece a importância de preservar o meio ambiente, especialmente na Amazônia, e defende a regularização fundiária e das áreas de manejo florestal, além de práticas sustentáveis que não causem degradação ambiental.
“Nós sabemos das dificuldades. Cada dia fica mais difícil trabalhar com madeira de lei, tanto pela legalização da origem quanto pela falta de áreas de manejo. Mas, se tivermos maior apoio do poder público, poderemos continuar trabalhando e cuidando da floresta. Nossa categoria é muito cobrada, mas não tem o apoio e o reconhecimento do poder público no setor de marcenaria e movelaria”, lamenta.
Garrido enfatiza que o impacto das marcenarias e movelarias no meio ambiente é menor do que o de outras atividades que utilizam recursos naturais, como o setor serralheiro, devido ao consumo reduzido e ao uso consciente da madeira, com mínimo desperdício. Ele acredita que o apoio à categoria é essencial para a continuidade da profissão.
“Nós não temos um consumo tão grande de madeira quanto uma serraria. O consumo é menor e mais consciente. Se tivermos apoio efetivo do Poder Público, especialmente no cumprimento da legislação ambiental, poderemos continuar trabalhando com mais segurança”, conclui.