Apesar da queda no índice do IBGE, o número dos que não sabem ler ou escrever ainda é considerado alto se comparado a outros estados da região Norte
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Este domingo (8) marca a passagem do Dia Internacional da Alfabetização, data instituída pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), no século passado (em 1966), para incentivar o pleno letramento da população internacional. Apesar da melhoria do acesso às escolas desde 2018, e da queda no ranking de analfabetismo no estado, ainda existem no Amazonas 168 mil pessoas que não sabem ler ou escrever, fazendo parte da estatística mundial onde 750 milhões de jovens e adultos tiveram pouco contato com a escrita e, não desenvolveram esta habilidade que nos dias atuais é vital para o mercado de trabalho.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD contínua 2018) sobre educação, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), demonstra que em números brutos, no ano passado (2018) havia cerca de 168.000 pessoas analfabetas no Amazonas, 35 mil só em Manaus (em 2016 eram 187 mil).
Entre todos os estados brasileiros, o Amazonas registrou a 10ª menor taxa de analfabetismo. A taxa de analfabetismo das pessoas com 15 anos de idade ou mais foi de 5,8%, menor que em nível nacional, que foi de 6,8%.
De acordo com a Secretaria de Estado de Educação e Qualidade de Ensino (Seduc-AM), a diminuição, ainda que lenta e gradual, dos índices de analfabetismo no AM deve estar principalmente à maior escolarização das crianças, que tem sido atendidas com um número maior de creches e escolas de séries iniciais do ensino fundamental e o relativo êxito nas estratégias de alfabetização no Estado.
‘’No entanto, não é suficiente alfabetizar sem garantir sequencialmente uma capacidade de leitura, redação e interpretação de textos adequadas, o que é essencial para evitar o analfabetismo funcional. Avançamos muito mais no letramento inicial, o que é positivo, mas ainda temos esse grande déficit de aprendizagem interpretativa da leitura’’, ressaltou a Seduc.
Redução
De acordo com a ‘’PNAD contínua’’, o Brasil tem 11,3 milhões de analfabetos (com 15 anos ou mais). Em relação a 2017, houve uma redução de 121 mil analfabetos no Brasil. E, mais uma vez, os negros são mais afetados pelo problema que os brancos: são 9,1% contra 3,9%.
No Brasil o analfabetismo está diretamente associado à idade. Quanto mais velho o grupo populacional, maior a proporção de analfabetos. O que pode ser um reflexo de uma melhora da alfabetização ao longo dos anos. Segundo os números de 2018, eram quase 6 milhões de analfabetos com 60 anos ou mais, o que equivale a uma taxa de analfabetismo de 18,6% para este grupo etário.
A taxa do chamado “analfabetismo absoluto” no Brasil é de 6,8%. Como ocorre com os dados internacionais, o analfabetismo não atinge a todos da mesma forma. “Na análise por cor ou raça, em 2018, 3,9% das pessoas de 15 anos ou mais - de cor branca - eram analfabetas, percentual que se eleva para 9,1% entre pessoas de cor preta ou parda. No grupo etário 60 anos ou mais, a taxa de analfabetismo das pessoas de cor branca alcança 10,3% e, entre as pessoas pretas ou pardas, amplia-se para 27,5%”, descreve nota do IBGE.
Netos e avós
Segundo os pesquisadores ouvidos pela Agência Brasil, o volume de analfabetos é bastante alto e não diminui por falta de investimentos na Educação de Jovens e Adultos (EJA). “Para um gestor público, prefeito, governador, interessa muito mais investir em educação básica, não na Educação de Jovens e Adultos, porque é uma parcela muito pequena”, critica Maria do Rosário Longo Mortatti, professora titular da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e também presidente emérita da Associação Brasileira de Alfabetização. Segundo ela, o investimento no EJA é “secundarizado”.
Por trás desse comportamento, há antigo raciocínio entre gestores públicos de que a “dinâmica demográfica”, com a renovação das gerações, extinguiria o analfabetismo absoluto no passar dos anos, conforme lembra Maria Clara Di Pierro, professora de Educação da Universidade de São Paulo (USP), especializada em políticas públicas de jovens e adultos.
“Esse raciocino não é novo. O ex-ministro [da educação] já falecido Paulo Renato usava muito esse argumento, dizendo ‘vamos concentrar os nossos esforços nas novas gerações. A sucessão geracional se encarregará de eliminar o analfabetismo’. Alguns pesquisadores e jornalistas compartilham essa visão, mas ela é duplamente equivocada”, aponta.
“De um lado, porque a gente continua produzindo analfabetismo, não se trata apenas de um resíduo do passado e os idosos estão vivendo mais. De outro lado, nós temos o analfabetismo funcional mediado pelo sistema educativo. Então, essa esperança ‘vamos deixar os velhinhos morrerem para acabar com o problema’ é uma ilusão, e não faz frente ao que temos de enfrentar”, complementa Di Pierro.
A mesma visão tem a professora Francisca Izabel Pereira Maciel, diretora do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela ressalta que o poder público “não pode descuidar do analfabetismo absoluto” e que “é direito das pessoas aprender a ler e escrever”.
Ainda que o analfabetismo absoluto atinja predominantemente os mais idosos, a professora Francisca Izabel salienta que em muitas famílias são os avós que cuidam dos netos enquanto os pais trabalham. A falta de escolaridade entre os mais velhos dificulta o acompanhamento escolar e pode desestimular o interesse pelos estudos entre os mais novos.
Analfabetismo funcional
As estatísticas do IBGE consideram as pessoas com 15 anos ou mais que foram declaradas como analfabetas em pesquisa periódica de amostra domiciliar. Os números, no entanto, podem ser ainda mais graves se for medida a “capacidade de compreender e utilizar a informação escrita e refletir sobre ela” - como faz o estudo Indicador de Alfabetismo Funcional, elaborado pelo Instituto Paulo Montenegro e pela Ação Educativa.
Testes cognitivos aplicados no ano passado em 2.002 pessoas residentes em áreas urbanas e rurais de todo o país verificou que 29% das pessoas podem ser consideradas analfabetas funcionais e que não superam o nível rudimentar de proficiência. Apenas 12% da população é considera “proficiente”.
Roberto Catelli Jr., coordenador Adjunto da Ação Educativa, explica que o analfabeto funcional é considerado a pessoa “capaz de identificar palavras, números, assinar o nome e ler frase. Mas não consegue realizar tarefa se precisar ler um pouco mais que isso - um parágrafo de um texto da vida cotidiana”, como recorte de jornal, um cartaz ou até mesmo uma receita de bolo.
A proporção de analfabetos funcionais no Brasil totaliza 38 milhões de pessoas. O volume dessa população é maior que quase todos os estados brasileiros, só perde para o total de residentes no Estado de São Paulo (41,2 milhões).
*Colaborou Luiz G.Melo
*Com informações da Agência Brasil