Dado está presente no novo Anuário Estadual de Mudanças Climáticas. Enchentes e secas foram eventos mais comuns
Novo Anuário Estadual de Mudanças Climáticas ressalta que Amazonas ainda precisa ter plano de adaptação e cita existência de Fundo Clima e Plano de Contigência (Foto: Alex Pazzuelo/Secom)
Entre 2000 e 2023, o Amazonas teve 976 desastres climáticos, com mais da metade das ocorrências sendo relacionadas a inundações (54%), seguidas por estiagens (20%) e erosões (9%). Apesar de a ciência avisar há décadas que esses eventos se tornarão mais frequentes e intensos em razão das mudanças climáticas, o estado ainda não tem um plano de adaptação e mitigação para o problema. A gestão Wilson Lima (União) espera ter o documento ainda neste primeiro semestre de 2025.
Os dados acima foram divulgados na primeira edição do Anuário Estadual de Mudanças Climáticas, produzido pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) e Centro Brasil Clima). A publicação, inédita no Brasil, divulgará anualmente informações sobre as políticas das unidades da federação para reduzir os impactos dos extremos do clima.
Em números absolutos, ao longo de 23 anos, foram 529 inundações, 190 secas, 83 erosões, 40 alagamentos, 32 vendavais/ciclones e outros 100 desastres, somados, de menor ocorrência. O Anuário cita como fonte primária o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR).
A estiagem de 2024, considerada histórica no Amazonas, afetou diretamente a vida de mais de 800 mil pessoas. O rio Negro, em Manaus, atingiu 12,66 metros. Além de provocar dificuldade para acessar água potável, alimentos e combustível para a população, o fenômeno deu um prejuízo de ao menos R$ 1,5 bilhão à indústria do estado, a espinha dorsal da Zona Franca, principal matriz econômica amazonense.
Desastre mais comum no estado, a enchente também provoca seus próprios danos. Na cheia histórica de 2021, quando o rio Negro em Manaus atingiu 30,02 metros, houve um prejuízo de ao menos R$ 165 milhões a produtores rurais, segundo dados divulgados pelo Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal do Amazonas (Idam). O setor pesqueiro e o comércio também foram afetados. Além disso, inúmeras casas ficaram alagadas, aumentando casos de doenças transmitidas pela água, de invasão de animais perigosos e perdas de bens materiais.
Plano Clima
A ausência de plano de adaptação não é um problema exclusivo do Amazonas. Dos 26 estados e o Distrito Federal, apenas oito possuem essa política implementada. São eles: Acre, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Outros 19 estão com o plano em elaboração, revisão ou previsto, ou não possuem - o caso do Amazonas.
Para A CRÍTICA, o secretário de Meio Ambiente do Estado (Sema), Eduardo Taveira, afirmou que o plano está em construção e que na última quinta-feira se reuniu com a Defesa Civil do Estado para tratar do assunto. O encontro ocorreu após a criação do Comitê Permanente de Enfrentamento a Eventos Climáticos e Ambientais, pelo governador.
“O nosso plano de mitigação e adaptação às mudanças climáticas já está em construção. Porém, estamos aguardando a finalização do Plano Clima do Ministério do Meio Ambiente para não termos divergências entre a proposta federal e a estadual”, disse. Questionado sobre a expectativa para finalizar, ele respondeu “da nossa parte, a previsão é terminar ainda no primeiro semestre”.
Em novembro do ano passado, o titular da Sema já havia mencionado que a gestão estadual aguarda a finalização do Plano Clima federal. Ele explicou que a espera era necessária, “para que a gente não possa ter o mesmo problema que tivemos com o lançamento do plano de combate ao desmatamento e queimadas na Amazônia. Os estados se anteciparam, lançaram antes [...] e a quando a gestão federal lançou, os estados tiveram de adequar o que já estava feito”, disse.
Municípios estão em falta
Os 62 municípios do Amazonas, incluindo Manaus, também continuam sem planos climáticos. Por outro lado, uma iniciativa da Defesa Civil estadual junto às prefeituras busca auxiliar na criação de planos de contingência municipal.
O documento é voltado a estabelecer procedimentos em ocorrências de desastres naturais, como enchentes, deslizamentos, incêndios e tempestades, mas não é tão completo quanto um plano climático, que traz também diretrizes para conservação ambiental, emissões de gases do efeito estufa e transição energética, por exemplo.
Conforme levantamento disponibilizado no site da Defesa Civil estadual, dos 62 municípios do estado, 19 possuem o plano de contingência. Manaus aparece sem o documento, mas a última informação enviada pelo município é de fevereiro de 2024. No entanto, em maio do mesmo ano, a prefeitura da capital lançou seu documento.
“No momento em que ocorrer um desastre, esse plano passa a ser usado naquele evento. Quando tomamos conhecimento, disparamos o plano de contingência e todas as secretarias envolvidas passam a seguir os protocolos registrados no plano”, disse à época o secretário-executivo de Proteção e Defesa Civil Municipal, Gladiston Silva.
Manaus também está em dívida com seu plano climático. O prefeito David Almeida (Avante) anunciou a elaboração do documento em maio de 2023, mas 20 meses depois, o projeto não avançou. A expectativa é que também fique pronto neste ano.
COP pressiona gestores da região
Um fator que pressiona os governos da região é a realização, em novembro, da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP) em Belém (PA). O evento, que reunirá cerca de 70 mil pessoas (dentre chefes de Estado, executivos e ativistas), é visto como um espaço para governadores e prefeitos buscarem investimentos para tocar projetos em seus estados. O governador Wilson Lima e o prefeito de Manaus, David Almeida, já confirmaram presença.
Durante o lançamento do Anuário em Brasília, na quinta-feira, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, afirmou que a pasta deve engajar mais de 500 municípios no desenvolvimento de seus planos. Ela defendeu que a Conferência do Clima deste ano seja a COP da Implementação.
“Tudo que poderia ser negociado foi negociado e até protelado. Hoje estamos em uma situação bastante difícil de ter atingido 1,5°C [de aumento da temperatura do planeta]. Temos o desafio de não deixar ultrapassar. Governos, ciência e sociedade terão de fazer um esforço muito grande”, disse.
AM é o 3º em emissões por termelétricas
Outro dado que chama atenção no Anuário Estadual de Mudanças Climáticas é o de que o Amazonas é o terceiro estado com mais emissões de gases do efeito estufa em termelétricas do Sistema Interligado Nacional (SIN), rede de transmissão de energia elétrica que conecta a maioria das usinas, subestações e consumidores do Brasil.
Em 2023, o estado emitiu 2,9 milhões de toneladas de CO², ficando atrás apenas do Rio Grande do Sul, com 4 milhões de toneladas, e de Santa Catarina, com 3,8 milhões. No Amazonas, a principal fonte dessas emissões foi a usina Mauá 3, localizada em Manaus e ligada ao SIN, que opera com gás natural.
De acordo com o Anuário, até 2023, 84% da geração de energia do Amazonas era baseada em termelétricas. As principais fontes eram o gás natural (65,9% dos registros) e óleo diesel (17,8%). A publicação ressalta que a região possui uma alta potencialidade para a energia fotovoltaica (solar) e sugere investimentos no setor. Até 2023, as fontes de energia solar eram 1,5% do total, no Amazonas, conforme o Anuário.