Objetivo é evitar possíveis danos aos bens arqueológicos durante o período de estiagem após o lugar, na orla do rio Negro, virar atração e atrair curiosos, colocando o patrimônio em risco
A superintendente do Iphan no Amazonas esteve no local (Reprodução/@biacalheiro)
Com o aumento do número de visitantes e curiosos no sítio arqueológico das Lajes, na orla de Manaus, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Amazonas anunciou nesta quarta-feira (25) um plano emergencial, que inclui o aumento do patrulhamento da guarda civil, além de policiais do grupamento ambiental e agentes federais, com o intuito de evitar possíveis danos aos bens arqueológicos durante o período de estiagem.
Na última terça-feira (24), um grupo foi até o local e, um dos integrantes, o artista e historiador amazonense Otoni Mesquita, aplicou uma pigmentação natural em uma das gravuras que possui aproximadamente 2 mil anos. Ele retirou em seguida, após a aplicação. O grupo divulgou um vídeo nas redes sociais mostrando a ação, que rapidamente se espalhou e gerou críticas de especialistas, artistas e lideranças indígenas.
Otoni Mesquita explica que sua ação teve a intenção de registrar as gravuras de uma forma que não causasse danos à obra e que utilizou o caulim, um material orgânico, para realçar as incisões das gravuras. Ele afirma que seu procedimento seguiu princípios acadêmicos e de conservação e restauração de arte.
No entanto, o autor reconhece que a divulgação das imagens sem uma explicação técnica adequada levou a interpretações equivocadas e à reação negativa do público. Em uma nota pública, Mesquita pede desculpas àqueles que se sentiram ofendidos.
Com a repercussão negativa, as publicações foram apagadas, e um pedido de desculpas formal foi publicado.
A ação não havia sido autorizada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que responde pela gestão do espaço, em parceria com a Soka Amazônia.
O órgão afirma que, para pesquisas de campo e escavações serem realizadas no local, é necessário obter aprovação prévia por meio de um projeto arqueológico submetido ao instituto. O processo de autorização também exige que os pesquisadores forneçam planos detalhados de pesquisa e documentação.
A reportagem apurou que nenhum pedido de autorização foi feito para a última terça-feira, dia em que o grupo foi até o local, gravou as cenas e divulgou nas redes sociais com uma convocação para mais uma excursão a ser realizada na próxima semana, que também foi cancelada após críticas.
Embora a técnica de argila líquida para destacar o relevo em rochas com sinais rupestres seja usada por pesquisadores em alguns tipos de investigações autorizadas, especialistas acreditam que tecnologias disponíveis por meio de câmeras de celular e aplicativos de edição de imagem podem substituir o método invasivo, tornando-o dispensável.
Na prática, o Iphan desempenha um papel crucial na preservação do patrimônio arqueológico do país, restringindo e controlando o acesso a esses locais para evitar a pilhagem e o tráfico ilegal de artefatos.
No entanto, apesar do investimento recorde deste ano em mais de R$ 7 milhões para áreas de preservação com o sítio das Lajes, o valor ainda é pouco para a dimensão das áreas a serem monitoradas de perto.
Para a pesquisadora e professora universitária Patrícia Melo, "as principais ameaças são a falta de recursos e de profissionais para assegurar a proteção dos sítios arqueológicos, além do notável desconhecimento que ainda cerca a questão da arqueologia no Brasil", alerta.
Além do valor científico, existe o valor sagrado. Para a liderança indígena Vanda Witoto, as gravuras recém-reveladas representam a ancestralidade da memória dos povos indígenas que habitaram a região amazônica, e por isso devem ser consideradas sagradas.
Gravuras podem ser vista apenas em secas extremas (Reprodução)
Atualmente, o Iphan trabalha com um plano de ação para pesquisar e cadastrar sítios arqueológicos no estado do Amazonas.
O "Sitio Arqueológico Ponta das Lajes," tombado pelo Iphan, apresenta "rostos humanos" em petróglifos, que reapareceram pela segunda vez em 2010, com a primeira aparição em novembro daquele ano, quando foram descobertos por Walter Calheiros, pesquisador educacional, por acaso durante um temporal.
O jornal A Crítica registrou o reaparecimento das gravuras milenares.
Jornal A Crítica impresso - 9 de novembro de 2010
O local é conhecido por suas inscrições rupestres e é composto por rochas de nome aretino, sendo também um ponto de desova de jaraqui durante as cheias.
A região está prestes a abrigar o "Parque Encontro das Águas – Rosa Almeida," a ser construído a 400 metros do sítio arqueológico, com previsão de entrega em outubro do ano seguinte e orçamento de R$ 80 milhões.
No último dia 17, a superintendente do Iphan no Amazonas, Beatriz Calheiro, esteve no local fazendo uma visita técnica.
Algumas das gravuras parecem rostos sorrindo (Reprodução)
Outros desenhos geométricos também podem ser vistos (Reprodução)
Sulcos de, provavelmente, amolação de instrumentos também estão entre os achados arqueológicos do local (Reprodução)