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Assassinato de indígenas pela ditadura ainda exige respostas, dizem vigiados por militares

Esclarecimentos sobre chacina no território Waimiri-Atroari durante construção da rodovia BR-174 é um dos pontos cobrados por amazonenses que sobreviveram à repressão

Waldick Júnior
online@acritica.com
30/03/2024 às 16:20.
Atualizado em 30/03/2024 às 16:24

Indígenas Waimiri-Atroari, 1970. (Foto: Paul Lambert/ISA)

Amazonenses investigados pela ditadura militar brasileira, que completa 60 anos neste 1º de abril, dizem que ainda é preciso dar respostas para o assassinato de indígenas na região, pelo governo da época. Segundo relatório da Comissão Nacional da Verdade (CMN), ao menos 8,3 mil indígenas morreram, comprovadamente, por violências e omissões promovidas pela ditadura.

“Esse período foi uma tragédia para as populações indígenas. Basta lembrar da chacina que aconteceu no território dos Waimiri-Atroari, que ainda está mal contada. Isso precisa ser mais analisado, porque houve uma chacina dos militares contra os indígenas”, afirma o escritor amazonense Milton Hatoum, que chegou a ser preso duas vezes por participar de manifestações estudantis em Brasília (DF) e em São Paulo (SP).

Ele lembra que a CMN investigou as mortes, mas defende a retomada dos trabalhos para avançar com novos esclarecimentos sobre o tema. Questionado sobre a frase do presidente Lula (PT), no mês passado, sobre querer evitar “remoer o passado” e tocar “a história para frente”, se referindo ao golpe de 1964, Milton Hatoum diz que “é preciso entender o passado para avançar no futuro”. 

Escritor amazonense Milton Hatoum (Victor Dragonetti/acervo Itaú Cultural)

“Não adianta a gente adiar esse compromisso com a verdade histórica. Nem adiar, nem camuflar. A minha geração foi muito marcada pelo golpe e nós falhamos, porque houve um acordo em 1979 de anistia geral. Quer dizer, os torturadores, os criminosos foram anistiados”, avalia o escritor.

 Considerado um dos maiores autores da literatura brasileira contemporânea, Hatoum tem livros com histórias que se passam no contexto da ditadura militar. “Abordei essa longa noite da política brasileira, do golpe, em dois romances. A Noite da Espera e Ponto de Fuga. São ambientados nesse contexto de repressão e foram a minha vingança literária, posso dizer”, comenta.

Amazônia

Para a jornalista, articulista do jornal A CRÍTICA e docente da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Ivania Vieira, o “seguir em frente” precisa e deve ser traduzido pelo ato de se fazer justiça. Um desses enfrentamentos diz respeito a fatos ocorridos na região amazônica. 

“Ainda precisamos fazer muito para enfrentar todas as sequelas da ditadura no Brasil e, enfatizo, na Amazônia, onde um discurso triunfalista do golpe militar-civil permanece e tem audiência”, ressalta.

Jornalista Ivania Vieira (Divulgação)

 Quando ainda era estudante da Ufam, aos 23 anos, Ivania chegou a ser espionada pelo governo militar, conforme arquivos do Serviço Nacional de Informação (SNI) trazidos a público pela Associação dos Docentes da Ufam (ADUA). 

Entre os anos 1960 e 1970, militares incentivaram a “ocupação na Amazônia”, o que contou com a realização de uma série de obras de infraestrutura que passaram por cima de territórios tradicionais e outras áreas de preservação. No Amazonas, o caso de maior repercussão foi o dos Waimiri-Atroari, na construção da rodovia BR-174 (Manaus - Boa Vista) e na Hidrelétrica de Balbina. Ao menos 2,6 mil indígenas do povo foram mortos, cerca de 85% do total da população.

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