ENTREVISTA

'A câmera serve também para proteger a conduta do policial', avalia delegado-geral

Delegado-geral da Polícia Civil do Amazonas, Bruno Fraga destaca como prioridades de sua gestão o investimento em inteligência, para aprimorar as investigações contra o crime organizado, e a humanização de atendimentos

Thiago Monteiro
online@acritica.com
04/02/2023 às 10:07.
Atualizado em 04/02/2023 às 10:07

Na PC-AM desde 2011, Bruno Fraga já passou por diversas delegacias (Junio Matos)

Um mês à frente da Polícia Civil do Amazonas, o delegado-geral Bruno de Paula Fraga, 41, pretende realizar um plano estratégico na Polícia Judiciária, fortalecer o trabalho investigativo e investir em tecnologia, com foco para o enfrentamento aos crimes cibernéticos. O atendimento aos cidadãos, segundo ele, será uma prioridade humanizar o serviço policial.

“O policial exerce uma função muito complicada e a pessoa quando vai a delegacia está com um problema muito grande. Ninguém vai na delegacia dar os parabéns para o policial está sempre levando um problema grande e o policial que está lá enfrentando esse problema a todo momento. Queremos modernizar a polícia, principalmente, no trabalho de investigação”.

O delegado-geral não se opôs ao uso de body cams (câmeras corporais) - defendidas por especialistas para redução da violência policial. Para Fraga, o uso do dispositivo seria a comprovação que “o serviço da polícia presta”.

Confira abaixo a entrevista completa:

 Quais serão as suas prioridades no comando da Polícia Civil?

Fortalecer o trabalho de investigação. O papel principal da Polícia Judiciária é fazer com que o crime seja desvendado e que a Justiça receba elementos robustos para o Ministério Público oferecer uma denúncia e aí, sim, aquele preso ficar de forma consistente no sistema prisional. Para que ele saia de circulação, da sociedade e não volte a cometer delitos que foram o sossego do nosso Estado e dos nossos amazonenses.

 Como ocorreu a sua escolha para delegado-geral?

Eu ingressei na Polícia Civil em 2011 e vim trabalhando durante todo esse tempo em diversas áreas da instituição. Comecei como delegado titular no interior, em Benjamin Constant, posteriormente fui para Lábrea como titular e, em seguida, Parintins, também como titular da delegacia. Em ato contínuo fui removido para a Delegacia Especializada em Capturas e Polinter (DECP). Passei como titular em alguns Distritos Integrado de Polícia (DIPs), fui plantonista, fui delegado adjunto responsável pelos homicídios da área da Zona Leste na Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), fui titular do 26° DIP, fui da Seccional Norte, que é responsável por coordenar todas as delegacias da Zona Norte de Manaus, ingressei como Diretor do Departamento Polícia do Interior (DPI) para coordenar todas as delegacias do interior que são 61 municípios, no entanto, são 70 delegacias, pois tem municípios com delegacias especializadas. Depois, fui diretor do DRCO (Departamento de Repressão ao Crime Organizado), retornei ao DPI, depois fui Delegado-Geral Adjunto, por quase um ano e aí recebi o convite do governador para assumir essa responsabilidade, que é um desafio muito grande para gerir a instituição como delegado-geral.

 Por que só algumas delegacias funcionam em regime 24 horas no Amazonas? Na sua avaliação, essa limitação não frustra o registro de crime pelos cidadãos?

Hoje o registro dos Boletins de Ocorrência eles podem ser feitos de forma virtual, mas nós vamos melhorar. Esse é um dos projetos, que é melhorar a qualidade de atendimento ofertado para a população amazonense. Isso vai ser fruto de um projeto de capacitação dos nossos servidores e também vai ser possível em razão do concurso, aí é mais um investimento do nosso governador para que outros colegas e novos policiais que vão terminar (os trâmites para assumir) no dia 17 de fevereiro. Então, logo sejam nomeados – e acreditamos que isso não vai demorar muito – ingressem na Polícia Civil robustecendo o nosso quadro de servidores e permitindo que tenhamos um melhor atendimento para a nosso sociedade.

 Atualmente, o número de delegados, escrivães e de investigadores é o ideal para realizar o trabalho de investigação criminal com qualidade? Existe déficit de profissionais?

A Polícia Civil se esforça muito para atender a demanda reclamada e nós estivemos muito tempo sem concurso. O governador Wilson Lima percebeu essa necessidade. O concurso está em andamento, em sua fase final e aí já teremos um reforço no nosso quadro.

 O concurso realizado no ano passado pelo Governo do Amazonas prevê em ampla concorrência entre delegados. Qual será o destino da maioria desses aprovados?

Prioritariamente esses servidores vão para os interiores. O concurso foi feito para que nós consigamos encher nossos interiores e aí todo município do Amazonas vai ter um delegado e os colegas que estão nos interiores serão transferidos para a capital. Então, nós vamos ter alocação de delegados, escrivães e investigadores em todos os municípios e o contingente que está nesses interiores será trazido de volta para Manaus

 A queixa entre a maioria dos delegados é que a polícia faz a sua parte no combate à criminalidade, mas na maioria das vezes a Justiça acaba soltando os criminosos. Mas, neste caso, para isso acontecer, o problema não estaria na qualidade das provas e da investigação feita pela polícia judiciária?

Infelizmente é difícil que hoje nós consigamos fazer a prisão de alguém que já não tenha sido preso. Existem algumas questões, mas o fato é que a nossa legislação é deficitária, a legislação é ruim. Se o crime não for hediondo, o criminoso condenado sai com 1/6 da pena, então, a legislação é frágil. A culpa não é do Judiciário. Então, esse jogo de empurra eu não acho certo fazer.

 Um levantamento do Instituto Sou da Paz feito em 2019 apontou que o Brasil só resolve 37% dos homicídios. O estado com o maior índice é Rondônia com 90%. O Amazonas e outros sete estados não apresentaram dados necessários para fazer o cálculo. Ao que se deve esse baixo índice?

Não posso falar pela estatística do Brasil inteiro, mas posso falar que a Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS) do Amazonas em 2022 conseguiu elucidar e prender 318 homicidas. Então, a conta é simples: é quase um homicida preso por dia, de forma ininterrupta, contando sábado, domingo, feriado. É uma delegacia que não pára, extremamente atuante e, apesar de nossas necessidades estruturais, não deixa de apresentar resultados para a população amazonense.

A Delegacia de Homicídios do Amazonas é uma referência para o Brasil. Nesse ano já temos alguns casos de repercussão, que encontram-se elucidados pela DEHS graças ao trabalho, a vocação tanto dos delegados, quanto investigadores, escrivães e equipe administrativa que atua na delegacia.

 Qual é a sua avaliação do uso de câmeras corporais no uniforme de policiais? A adoção deste dispositivo no Amazonas poderia ter evitado alguns crimes?

O uso de câmeras apesar de ser um tema bastante controvertido ele pode acabar servindo de lastro para provar o serviço que o policial presta. Muitas das vezes nós somos confrontados, o nosso trabalho é colocado em questionamento em razão que uma operação que um bandido é alvejado nas costas, em que há uma troca de tiros e aí sempre questionam. Após o crime ter ocorrido, toda a dificuldade que o policial enfrenta nunca é visto.

Às vezes, um criminoso enfrenta a polícia e deixa sua arma e os populares acabam tirando a arma dali e o criminoso “vira” um pai de família, estudante. Então, a câmera serve também para proteger a conduta do policial.

 Quais as estratégias estão sendo planejadas pelo Estado para o combate ao crime organizado?

O Estado do Amazonas, eu sempre digo isso tem dimensão continental. Nós temos vizinhos que são maiores produtores de drogas do mundo. Temos uma dificuldade geográfica por termos uma quantidade grande de rios, que são imensos. Isso acaba facilitando. O principal plano estratégico para o combate e enfrentamento, consequentemente para diminuição da criminalidade, é ter uma atenção sensível para as organizações criminosas e investimentos no [combate aos] crimes cibernéticos, é fortalecer as investigações, principalmente, no que tange as organizações criminosas, porque a disputa territorial que acaba culminando numa série de danos e no aumentos dos homicídios, furtos, dos roubos, que decorrem da mercancia de drogas e principalmente a dinâmica da mudança da sociedade. Nós temos quantas pessoas lesadas na sociedade com golpes de Pix, bancários, estelionatos de todo o tipo, utilizados através de celulares, computadores. Então, nosso investimento vai ser na investigação através nessas duas pontas, sem esquecer das nossas delegacias especializadas.

A polícia não vai deixar de investir e ter um olhar sensibilizado para as questões envolvendo menores, os abusos envolvendo crianças, que infelizmente acontecem em 2023, também na agressão contra as mulheres, pessoas que estão em alguma vulnerabilidade. Então, toda essa conjuntura será observada para que a melhoria da investigação resulte em melhores resultados para a sociedade amazonense.

 Boa parte dos crimes registrados no Amazonas tem relação direta com o tráfico de drogas, quais medidas a sua gestão vai propor para combater essa realidade que enlutou inúmeras famílias?

A Polícia Civil do Amazonas apreendeu ano passado, quase dez toneladas de drogas, então, pretendemos fazer, através de tecnologia, uma ligação maior com os nossos municípios e a capital, ou seja, melhorando a comunicação, permitindo uma troca rápida de dados e investimento em tecnologia. Hoje tudo é feito, planejado através de computadores, de celulares e redes sociais, então, vamos capacitar os nossos servidores e investir em tecnologia.

Fraga tem 41 anos, é natural de Minas Gerais e é graduado em Direito pela Universidade de Vila Velha/ES (Junio Matos)

Qual a marca sua gestão quer dar na Delegacia Geral?

Melhorar a qualidade do atendimento, ofertando um trabalho mais humanizado para a população, pois nós sabemos das dificuldades dos dois lados. O policial exerce uma função muito complicada e a pessoa quando vai a delegacia está com um problema muito grande. Ninguém vai na delegacia dar os parabéns para o policial está sempre levando um problema grande e o policial que está lá enfrentando esse problema a todo momento. Queremos modernizar a polícia, principalmente, no trabalho de investigação. O que nós queremos com isso? Fortalecer a parte investigativa e aproximar a Polícia Civil do Amazonas da sociedade.

Perfil

Idade: 41 anos 

Nome: Bruno de Paula Fraga

Estudos: Fraga é natural de Minas Gerais, graduado em Direito pela Universidade de Vila Velha/ES (2005) e pós-graduado em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes/MG (2009) e em Direito Penal pelas Faculdades Integradas de Jacarepaguá – RJ (2012).

Experiência: Ingressou na polícia em 2011, por meio de concurso público. Já atuou como titular de diversas delegacias no interior do Amazonas, dentre elas as de Parintins, Benjamin Constant e Lábrea.

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