Difícil lembrar de um único apresentador negro que tenha se tornado um fenômeno da publicidade por desfrutar do horário nobre da emissora
Há oito anos, esta foi a primeira formação do É de Casa (Foto: Divulgação)
*Por André Alves, jornalista.
Pense comigo: onde estavam os negros na programação da maior emissora de TV do país, nas últimas décadas? A começar pelo entretenimento, qual é a figura que vem à memória do brasileiro no comando dos programas de auditório? Xuxa, Angélica, Faustão…e?
Alguma voz negra na narração do futebol da Globo? E no Big Brother Brasil, fenômeno de audiência e publicidade há mais de 20 anos, algum apresentador negro? E nas “Super Manhãs” da emissora?
Como é perceptível, a Rede Globo vem acelerando mudanças para, finalmente, colorir sua programação com a cara do Brasil real, que não tem apenas uma mistura de cores, mas de vozes e de sotaques. Só agora, a emissora parece encaixar negros em espaços que naturalmente já deveriam estar ocupados, mas que foram dominados por homens e mulheres com aspecto europeu, durante décadas.
Por conta disso, fica difícil lembrar o nome de um único apresentador negro que, ao desfrutar da fama, do horário nobre da Globo e da audiência, tenha se tornado um fenômeno da publicidade, como é o caso de Luciano Huck, Marcos Mion, Fátima Bernardes, Ana Maria Braga, Thiago Laifert (que ainda goza dessa fama mesmo fora da emissora), Patrícia Poeta, entre outros – todos muito competentes, aliás.
Até aqui, nem falamos da posição ocupada por negros em novelas, durante décadas. Algum “galã” negro? Mais fácil lembrar de Fábio Assunção, Cauã Reymond e Tarcísio Meira. Das nove “Helenas” do autor Manoel Carlos, uma foi negra: Taís Araújo. Os personagens de porteiros, babás e bandidos, porém, foram quase sempre interpretados por negros.
Como todo mundo sabe, televisão é uma vitrine para artistas, jornalistas e apresentadores. Em se tratando de consumo audiovisual em todas as suas formas, a TV segue firme e forte - 84,8% do consumo audiovisual no Brasil ainda se dá pela TV aberta ou fechada.
Nesse quesito, não é de hoje que a Globo lidera a audiência. E não é de hoje que negros são maioria no Brasil. Logo, as mudanças na programação da emissora atendem a uma lógica (e é fruto de pressão), mas o atraso de quase meio século denuncia um olhar que contribuiu com o preconceito e estigmatizou negros e negras.
Como fez a revista National Geographic um dia, ao reconhecer que durante décadas manteve uma cobertura racista, a Globo deveria fazer o mesmo, pelos espaços não ocupados por negros, durante décadas. Além de pedir desculpas, ampliar esses espaços seria uma boa medida - para dizer o mínimo.