Apesar do aumento de denúncias, vítimas reatando o relacionamento com agressores devido ao julgamento de familiares e sociedade
Titular da Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher, área Centro-Sul, delegada Patrícia Leão (Foto: Daniel Brandão/A Crítica)
Durante essa semana, vários casos de violência doméstica foram noticiados na imprensa amazonense, mas um caso em particular, chamou mais a atenção: a ocorrência de violência doméstica no Centro de Manaus que resultou na morte de um policial militar e um militar do Exército Brasileiro.
Posteriormente foi constatado que a companheira do militar EB havia reatado o relacionamento mesmo já tendo denunciado o agressor na Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM).
Mas o que leva essas vítimas a acabarem voltando para seus agressores? A resposta é preocupante: a falta de apoio e o julgamento de familiares e da sociedade.
Segundo a delegada Patrícia Leão, titular da DECCM Centro-Sul, apesar do crescente aumento do número de denúncias no Amazonas por lesão corporal, que subiu de 1357 para 1454, no período de janeiro a abril de 2023 e 2024, conforme dados mais recentes da Secretaria de Segurança Pública (SSP-AM), a delegacia enfrenta a dificuldade de prosseguir com o processo e até manter as vítimas longe dos agressores, devido a fatores como dependência financeira, apego emocional e religioso, além de ameaças.
Ainda conforme a delegada, as vítimas acabam se sentido culpadas porque acabam sendo julgadas pela família e comunidade, que a colocam como a errada e causadora do crime, afetando principalmente o psicológico destas mulheres. "Isso mostra o quanto o machismo estrutural, influência nos crimes contra as mulheres", disse a delegada Leão.
Uma das primeiras pessoas que confortam a mulher vítima de violência doméstica, é a psicóloga do Sistema de Apoio Emergencial à Mulher (Sapem), Beatriz Silveira, que revelou que geralmente, a mulher acaba voltando para o ambiente violento por não ter amparo da família e de amigos, seja emocionalmente ou até mesmo financeiro.
Profissionais que atuam no Sistema de Apoio Emergencial à Mulher. (Foto: Daniel Brandão/A Crítica)
O abalo no psicológico por falta dessa rede de apoio da própria família e também da sociedade afeta principalmente o rumo jurídico do caso. Além do desamparo, as ameaças de perder a guarda dos filhos, quando há no relacionamento, também afeta o psicológico destas mulheres, mas conforme a advogada Thays Sá, do Sapem, nada disso é levado em conta na hora do processo de guarda das crianças.
"A mulher está tão fragilizada e desamparada, que ela acredita em tudo que o agressor fala. Elas acham que a questão financeira influencia no processo, o que não. O que é valiado é o cuidado e o zelo com a criança e são feitas garantias que o agressor, pague a pensão nesse período, além da medida protetiva. A medida protetiva mantém o agressor distante, mas não o impede de pagar a pensão", esclareceu.
Outra resposta simples: ter empatia pelas vítimas e respeito pelas mulheres. Todas as especialistas salientaram esses dois pontos quando perguntadas sobre o que poderíamos fazer como sociedade para reverter essa triste realidade, como também não cultura do chamado "julgamento virtual" em comentários nas redes sociais.
Ademais, a advogada, fundadora e presidente do Instituto As Manas, Amanda Pinheiro, também acredita que quanto mais debates sobre o tema, palestras nas escolas, faculdades, igrejas e centros de fraternidade, melhor e necessário será para reeducação da sociedade.
Pinheiro também exemplificou que são nessas palestras ministradas pelo Instituto em escolas, que muito jovens acabam reconhecendo comportamentos violentos que possuem com as irmãs e até mesmo as mães, sem nem saberem que isso é configurado como crime.