Pirataria

Pirataria aumenta e já encarece custo de vida

Sindarma afirma que empresas estão contratando segurança privada e custo está sendo repassado aos consumidores

Waldick Júnior
waldick@acritica.com
22/06/2024 às 09:59.
Atualizado em 22/06/2024 às 11:33

Lancha de alta potência utilizada por piratas dos rios. Embarcação foi capturada pela Polícia do Amazonas durante operação no município de Fonte Boa, no rio Solimões, um dos mais afetados pelo problema (Foto: Divulgação)

Problema de décadas no Amazonas, a pirataria escalou a um novo nível e já afeta até o preço de mercadorias transportadas por embarcações no estado. Ao mesmo tempo, a principais medidas governamentais de combate ao problema, as balsas fixas e móveis de segurança, não têm sido 100% efetivas. 

Nesta semana, o deputado estadual Carlinhos Bessa (PV), membro da Comissão de Transportes da Assembleia Legislativa do Amazonas, relatou em plenário o aumento do cenário na região do Médio Solimões.

“A situação é alarmante. Na última semana um agricultor foi assassinado enquanto fazia a travessia de seus produtos. Ontem (19 de junho), outras pessoas foram atacadas e uma delas ficou gravemente ferida. Famílias inteiras estão com medo de navegar, os trabalhadores do transporte fluvial estão sendo ameaçados e o comércio local está sofrendo com a insegurança”, disse.

Vice-presidente do Sindicato das Empresas de Navegação do Amazonas (Sindarma), Madson Nóbrega afirma que as empresas têm precisado contratar segurança privada para navegar nos rios. O custo está sendo repassado aos clientes e, por consequência, aos consumidores.

“Uma segurança privada dessa é cerca de R$ 40 mil para uma viagem de dez dias entre Manaus e Porto Velho, por exemplo. Esse é um alto custo que as empresas não  conseguem absorver, então está sendo repassado”, disse para A CRÍTICA.

Em maio, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) divulgou, em levantamento, que a pirataria dos rios já havia causado um prejuízo de R$ 47 milhões em roubos de combustíveis, entre 2020 e 2023.

Madson comenta que os roubos de cargas começaram focados nos combustíveis, mas hoje já se estendem para todo tipo de produto transportado pelos navios, incluindo aqueles que levam grãos e outros derivados de petróleo.

Ele elogia a inauguração de bases fluviais pelo governo do Amazonas, uma aposta para reduzir o problema, mas diz que ainda há muitas regiões com vazios na atuação governamental.

“Falta um patrulhamento, porque essas balsas ficam em áreas específicas do rio, às vezes a horas de distância de onde acontecem essas ocorrências, porque os piratas já sabem onde fica a polícia e escolhem outros lugares para agir” afirmou.

 Na ponta

 Além de causar prejuízos à economia, a atuação dos piratas têm tirado a vida de trabalhadores da navegação e traumatizado outros. É o que diz o presidente do Sindicato dos Fluviários da Seção de Convés do Amazonas (Sindflu-AM), Joe Bastos.

“A gente recebe relatos, trabalhadores que procuram o sindicato para saber o que pode ser feito. É algo que está aumentando muito. Os trabalhadores deveriam receber um adicional, inclusive, porque eles colocam suas vidas em risco a cada viagem”, defende ele.

Bastos defende uma atuação ostensiva das polícias para o problema, ao passo que ainda considera insuficientes as ações tomadas até aqui. 

“Parece que é um comportamento de deixar rolar para ver se param de falar sobre. Ao contrário disso, só tem aumentado e precisamos que o poder público olhe para esse problema”, critica.

 MP investiga participação de agentes

 Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais (Caocrimo) e do Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), o promotor do Ministério Público do Amazonas (MP-AM), Igor Starlling, afirma que há indícios de envolvimento de agentes públicos em auxílio à pirataria nos rios.

“As operações recentes realizadas pelo GAECO, Polícia Civil e Militar demonstram indícios de envolvimento de agentes públicos, sendo, portanto, objeto de acompanhamento constante pelo Ministério Público, tanto na fase investigativa quanto na processual”, disse para A CRÍTICA. 

Segundo ele, o MP-AM também tem observado um aumento de ocorrências relacionadas aos piratas, em especial pelo relato de entidades como a Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Navegação Interior (Abani) e Instituto Combustível Legal (ICL).

“Dentre as razões para esse aumento, estão as dificuldades de se fiscalizar e prevenir, em razão da localidade em que se praticam os crimes, sendo trechos distantes, ermos e de difícil acesso e logística, bem como da alta rentabilidade da atividade”, pontua.

 SSP tem quatro balsas nos rios

 A reportagem procurou a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM) entre os dias 20 e 21 de junho para saber como a pasta vem atuando no problema, mas não houve resposta. Nesta sexta-feira, a SSP divulgou que o governo está enviando lanchas blindadas para utilização em operações de segurança no Médio e Alto Solimões.

“Já alinhamos com o comandante-geral da Polícia Militar do Amazonas (PMAM), coronel Klinger Paiva, e com o comandante do Batalhão de Tefé, tenente-coronel Pedro Moreira, e estaremos enviando nossas lanchas blindadas para conter, dentre outros crimes,  a ação de pirataria nos municípios de Tefé, Alvarães e Uarini”, disse o titular da SSP-AM, coronel Vinícius Almeida, em comunicado enviado à imprensa.

No mês passado, o secretário-executivo adjunto de operações da SSP-AM, coronel Agenor Teixeira, participou de uma audiência sobre a Amazônia na Comissão de Segurança da Câmara dos Deputados. 

Na ocasião, ele informou que o Amazonas possui quatro balsas em atuação nos rios. São elas: Arpão 1 (rio Solimões), Arpão 2 (rio Negro), Tiradentes (rios Japurá, Içá e Solimões) e Paulo Nery (rio Solimões). 

 A base Paulo Nery, instalada em Itacoatiara, em janeiro, fez zerar os roubos de combustível na região, de acordo com o secretário-executivo da pasta.

 É preciso investigar a origem’

 É impossível falar da pirataria dos rios sem citar o cenário do tráfico internacional de drogas. Especialistas associam os dois fenômenos, incluindo o aumento nos últimos anos.
Em relação ao crime organizado, a gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, Natália Pollachi, diz que não há um dado consolidado sobre o aumento do problema, mas relatos têm apontado para essa direção, incluindo o fortalecimento da atividade ilegal.

“Há uma percepção de que esse crime organizado está cada vez mais armado e mais estruturado, que alguns anos atrás se percebia um trânsito de embarcações mais simples, pessoas com armas mais simples ou sequer armadas, e que isso tem mudado nos últimos anos para embarcações mais potentes, mais velozes e com maior presença de pessoas fortemente armadas”, afirma.

Para ela, a instalação de bases de fiscalização é uma boa prática, mas é preciso ir além e investigar a origem da atividade ilegal. “É como falamos com todo tipo de crime organizado. Tem que seguir o caminho do dinheiro, identificar onde foi feita a compra das lanchas, de armas se elas vêm do mercado doméstico ou internacional, e ir minando a capacidade dessas organizações de realizar esse tipo de tráfico”, sugere.

Para o problema das longas distâncias, Natália sugere o investimento em embarcações menores, mas também o uso de drones para aumentar o alcance do patrulhamento.

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