Segundo rascunho apresentado finalmente traz um valor anual para financiamento climático, mas cifra está abaixo do que países em desenvolvimento pedem
(Foto: Zarzycka / NurPhoto via AFP)
Um rascunho divulgado pela presidência da 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 29) propõe que países em desenvolvimento recebam US$ 250 bilhões anuais (cerca de R$ 1,45 trilhões) das nações desenvolvidas para financiamento de mitigação e adaptação às mudanças do clima até 2035. O evento encerra nesta sexta-feira (22), mas as negociações para o texto final devem se estender até o fim de semana.
O número apresentado no rascunho está abaixo do que pedem as nações emergentes, US$ 1,3 trilhões anuais (R$ 7,5 trilhões). Além disso, o texto fala apenas que países ricos devem “liderar” o processo, abrindo margem para que não sejam totalmente responsáveis pelo recurso.
O rascunho também “chama todos os atores”, se referindo a países desenvolvidos e em desenvolvimento, para mobilizar recursos públicos e privados na ordem de US$ 1,3 trilhões anuais até 2035 para os países emergentes.
O texto divulgado nesta sexta-feira foi recebido com fortes críticas de organizações não governamentais que acompanham o processo. A avaliação geral é que os países emergentes devem negar o acordo, levando as negociações para o fim de semana.
Avaliações
A especialista do Greenpeace Brasil, Camila Jardim, destaca que a nova versão do documento é consideravelmente pior que a anterior. “O texto não resolve o problema da péssima qualidade do financiamento climático. Ao estabelecer uma nova meta de 250 bilhões de dólares ao ano (para substituir a anterior de 100 bilhões), reduz a responsabilidade dos países desenvolvidos ao dizer apenas que eles devem “liderar” tal financiamento”, avalia.
Segundo ela, o documento também não deixa claro qual percentual dos US$ 250 bilhões deve vir de doações ou de financiamento altamente concessionais (doações ou empréstimos a juros baixos, por exemplo).
“Novamente levanta preocupação sobre o endividamento dos países em desenvolvimento e a dificuldade de financiar a ação climática nesses países. Além disso, ao mencionar o US$ 1,3 trilhão como meta total até 2035, o texto espera que a solução venha do setor privado, que sabemos não ser o caso”, completa.
Diretor de América Latina e do Caribe do 350.org Ilan Zuman ressalta que uma decisão sobre financiamento é essencial não somente para o sucesso desta COP, mas da edição que acontecerá no próximo ano, em Belém (PA).
“O financiamento climático é essencial para destravar vários grupos de trabalho, como de mitigação, de transição energética justa. Para socorrer os países que estão sofrendo danos climáticos extremos e para auxiliá-los na adaptação a novos eventos. Tendo essa meta ambiciosa aqui, o Brasil pode focar em outros temas, como as novas metas climáticas dos países que devem ser apresentadas até fevereiro de 2025”, diz.
Entenda
Desde o início dos debates, os países mais ricos defendem aumentar a base dos que precisam financiar a adaptação e combate à mudança do clima. Já os mais pobres entendem que nações em desenvolvimento podem até doar, mas voluntariamente. Eles também pedem por mais provisão (doação ou empréstimos baixos), enquanto os mais ricos querem contabilizar financiamento por “mobilizações”, o que poderia incluir empréstimos aos países mais pobres, por exemplo.
O financiamento climático toma como base decisões de COPs anteriores e o Acordo de Paris, que definiu que países historicamente mais poluidores, como Estados Unidos e Reino Unido, precisam contribuir com a adaptação das nações mais pobres às mudanças climáticas.
O valor previsto era de US$ 100 bilhões anuais, mas há diferentes pontos de vista sobre se essa meta foi cumprida ou não. Hoje a defesa dos países em desenvolvimento e dos membros do G20 (maiores economias do mundo) é de que o montante precisa ser na casa dos trilhões.
*O repórter que assina esta matéria viajou a Baku, Azerbaijão, a convite do Instituto Clima e Sociedade (iCS)